Partido Comunista Internacional Corpo unitário e invariante das teses do partido

Partido Comunista de Itália
2º Congresso, Roma, Março, 1922

 
TESES SOBRE AS TÁTICAS DO PARTIDO COMUNISTA
TESES SOBRE A QUESTÃO AGRÁRIA
“Teses de Roma”

 
 
 
 
 

Teses Sobre as Táticas do Partido Comunista
 
 
 
Prefácion
O PROGRAMA DO PARTIDO
Natureza Orgânica do Partido Comunista
II  - O Processo de Desenvolvimento do Partido Comunista
III  - Relações entre o Partido Comunista e a Classe Proletária
IV   - Relações do Partido Comunista com Outros Movimentos Políticos Proletários
V   - Elementos das Táticas do Partido Comunista derivados do Estudo da Situação
VI   - Atividade Tática “Indireta” do Partido Comunista
VII  - Atividade Tática “Direta” do Partido Comunista
VIII   - O Partido Comunista Italiano e o Momento Presente
 
 
 
 
Prefácio

Estas teses têm como objeto o problema geral das formas e critérios pelos quais a ação do Partido Comunista deve ser levada a cabo para a realização do seu programa e a realização dos seus objetivos, e do método pelo qual o Partido determina a extensão e a direção dos seus movimentos e iniciativas. Os aspetos particulares deste problema, na medida em que tomam em consideração determinadas esferas da atividade do Partido (parlamentar, sindical, agrária, militar, nacional e colonial, etc.) não são aqui considerados em pormenor, uma vez que são objeto de outras discussões e resoluções, de congressos internacionais e nacionais.

Estas teses tomam como ponto de partida o programa adotado pelo Partido Comunista de Itália em Livorno, como expressão e resultado da doutrina e do método crítico da Internacional Comunista e do Partido, programa aqui reproduzido.

 

 

 

 
O Programa do Partido

O Partido Comunista de Itália (Secção da Internacional Comunista) é constituído com base nos seguintes princípios:

1) No regime atual social capitalista desenvolve-se um contraste cada vez maior entre as forças produtivas e as relações de produção, dando origem à antítese de interesses e à luta de classes entre o proletariado e a burguesia dominante.

2) As atuais relações de produção são protegidas e defendidas pelo poder do Estado burguês que, fundado no sistema representativo da democracia, constitui o órgão de defesa dos interesses da classe capitalista.

3) O proletariado não pode quebrar ou modificar o sistema de relações capitalistas de produção, do qual deriva a sua exploração, sem o derrube violento do poder burguês.

4) O órgão indispensável da luta revolucionária do proletariado é o partido político de classe.
O Partido Comunista, ao reunir dentro de si a parte mais avançada e consciente do proletariado, unifica os esforços das massas trabalhadoras, transformando-as das lutas por interesses de grupo e resultados contingentes para a luta pela emancipação revolucionária do proletariado.

O Partido tem a tarefa de difundir a consciência revolucionária entre as massas, de organizar os meios materiais de ação, e de dirigir, no decurso da luta, o proletariado.

5) A guerra mundial, causada pelas contradições íntimas e irremediáveis do sistema capitalista que produziu o imperialismo moderno, abriu a crise de desintegração do capitalismo, na qual a luta de classes só pode ser resolvida em conflitos armados entre as massas trabalhadoras e o poder dos estados burgueses.

6) Após o derrube do poder burguês, o proletariado só se pode organizar numa classe dirigente destruindo o aparelho estatal burguês e estabelecendo a sua própria ditadura, ou seja, baseando a representação estatal na base produtiva e excluindo a classe burguesa de todos os direitos políticos.

7) A forma de representação política no Estado proletário é o sistema de conselhos de trabalhadores (trabalhadores e camponeses), já em vigor na Revolução Russa, o início da revolução proletária mundial e a primeira realização estável da ditadura do proletariado.

8) A necessária defesa do Estado proletário contra todas as tentativas contra-revolucionárias só pode ser assegurada privando a burguesia e os partidos contrários à ditadura proletária de todos os meios de agitação política e propaganda e pela organização armada do proletariado para repelir ataques internos e externos.

9) Só o Estado proletário será capaz de implementar sistematicamente todas aquelas sucessivas medidas de intervenção nas relações da economia social através das quais será efetuada a substituição do sistema capitalista pela gestão coletiva da produção e distribuição.

10) Como resultado desta transformação económica e das consequentes transformações de toda a atividade da vida social, ao eliminar a divisão da sociedade em classes, será também eliminada a necessidade do Estado político e o seu papel será progressivamente reduzido ao da administração racional das atividades humanas.


I. Natureza Orgânica do Partido Comunista

1. O Partido Comunista, partido político da classe proletária, apresenta-se na sua ação como uma coletividade que opera com uma abordagem unitária. Os motivos iniciais que levam os elementos e grupos desta coletividade a incorporarem-se num organismo com uma ação unitária são os interesses imediatos de grupos da classe trabalhadora, decorrentes das suas condições económicas. A característica essencial da função do Partido Comunista é a utilização das energias incorporadas desta forma para a realização de objetivos comuns a toda a classe trabalhadora e situados no auge de todas as suas lutas; objetivos que assim transcendem os interesses de grupos únicos – integrando-os – e objetivos imediatos e contingentes tais como a classe trabalhadora pode propor.

2. A integração de todos os impulsos elementares numa ação unitária ocorre em virtude de dois fatores principais: um de consciência crítica, do qual o partido tira o seu programa; o outro de vontade, expressa no instrumento através do qual o partido atua, a sua organização disciplinada e centralizada. Seria errado considerar estes dois fatores de consciência e vontade como poderes que podem ser obtidos por, ou são de esperar de, indivíduos, uma vez que só são realizáveis através da integração da atividade de muitos indivíduos num organismo coletivo unitário.

3. A definição precisa da consciência teórica e crítica do movimento comunista, contida nas declarações programáticas dos partidos individuais e da Internacional Comunista, bem como a organização de um e do outro, foi e continua a ser alcançada através da analise e estudo da história da sociedade humana e da sua estrutura na época capitalista contemporânea, realizada com base em factos, experiência e através da participação ativa na luta proletária propriamente dita.

4. O anúncio destas declarações programáticas, e a nomeação dos homens a quem são confiados os vários cargos na organização do partido, é formalmente realizado através de uma consulta, democrática na forma, das assembleias representativas do partido, mas na realidade elas devem ser entendidas como produto do processo real que acumula elementos de experiência e realiza a preparação e seleção dos líderes, moldando assim tanto o conteúdo programático como a constituição hierárquica do partido.


II. O Processo de Desenvolvimento do Partido Comunista

5. A organização do partido proletário toma forma e desenvolve-se na medida em que existe – devido ao nível de maturidade a que a situação social chegou – a possibilidade de uma consciência e ação coletiva unitária na direção dos interesses gerais e últimos da classe trabalhadora. Por outro lado, o proletariado aparece e atua como uma classe na história precisamente quando a tendência para construir um programa e um método de ação comum, e portanto para organizar um partido, toma forma.

6. O processo de formação e desenvolvimento do partido proletário não apresenta um curso contínuo e regular, mas é suscetível tanto a nível nacional como internacional de fases e períodos de crise geral muito complexos. Muitas vezes tem ocorrido um processo de degeneração em que a ação dos partidos proletários perdeu, ou se afastou, em vez de se aproximar, daquele carácter indispensável de uma atividade unitária inspirada pelos mais altos objetivos revolucionários. Tornou-se fragmentado na busca da satisfação dos interesses de grupos limitados de trabalhadores, ou na obtenção de resultados contingentes (reformas) à custa da adoção de métodos que comprometeram o trabalho para objetivos revolucionários e a preparação do proletariado para tais objetivos. Assim, os partidos proletários acabaram muitas vezes por alargar as fronteiras da sua organização às esferas de elementos que ainda não se podiam colocar no terreno da ação coletiva unitária e maximalista. Este processo foi sempre acompanhado por uma revisão deformadora da doutrina e do programa, e por um tal afrouxamento da disciplina interna que, em vez de ter um pessoal geral de líderes capazes e resolutos na luta, o movimento proletário foi colocado nas mãos de agentes secretos da burguesia.

7. O caminho, para a organização de um verdadeiro partido de classe, para recuperar duma situação deste tipo sob a influência de novas situações e de novas pressões para agir exercidas pelos acontecimentos sobre as massas obreiras, tem lugar sob a forma de uma separação de uma parte do partido que através de debates sobre o programa, duma crítica de experiências desfavoráveis na luta, e a formação dentro do partido de uma escola e de uma organização com a sua própria hierarquia (fração) reconstitui a continuidade viva de um organismo unitário, baseado na posse de uma consciência e de uma disciplina, da qual surge o novo partido. Este é o processo que, em geral, conduziu do fracasso do Partidos da Segunda Internacional até ao nascimento da Terceira Internacional comunista.

8. O desenvolvimento do Partido Comunista após a resolução de tal crise, permitindo a possibilidade de fases críticas subsequentes produzidas por novas situações, pode facilitar a análise e ser definido como o desenvolvimento "normal" do partido. Ao mostrar a máxima continuidade na manutenção de um programa, e na vida da sua hierarquia liderante (para além da substituição individual de líderes desleais ou desgastados), o partido realizará também o máximo de trabalho eficaz e útil na conquista do proletariado para a causa da luta revolucionária. Não se trata simplesmente de exercer um efeito didático sobre as massas; e muito menos é um desejo de exibir um partido intrinsecamente puro e perfeito. É antes uma questão de alcançar o máximo rendimento no processo real, em que – como se verá melhor abaixo – através do trabalho sistemático de propaganda, proselitismo e sobretudo participação ativa nas lutas sociais, a ação de um número cada vez maior de trabalhadores é levada a deslocar-se do terreno de interesses parciais e imediatos para o terreno orgânico e unitário da luta pela revolução comunista. Pois só quando existe uma continuidade semelhante é possível, não apenas superar as hesitações desconfiadas do proletariado em relação ao partido, mas canalizar e incorporar rápida e eficazmente as novas energias obtidas num pensamento e ação comuns, criando assim aquela unidade de movimento que é uma condição revolucionária indispensável.

9. Por todas as mesmas razões, a agregação ao partido de outros partidos ou partes separadas dos partidos deve ser vista como totalmente anormal. Um grupo que até esse momento se distinguia por uma posição programática e organização independente diferente não traz consigo um conjunto de elementos que possam ser efetivamente assimilados em bloco; pelo contrário, prejudica a solidez da posição política e estrutura interna do antigo partido, de modo que o aumento de número de membros está longe de corresponder a um aumento da força e do potencial do partido – de facto, poderia por vezes paralisar o seu trabalho de organização das massas em vez de o facilitar.

É desejável que, logo que possível, seja declarado inadmissível, no seio da organização comunista mundial, afastar-se de dois princípios fundamentais de organização: em cada país, só pode haver um único partido comunista; e só é possível aderir à Internacional Comunista através da admissão individual no partido comunista do país em questão.


III. Relações entre o Partido Comunista e a Classe Proletária

10. A especificação e definição das características do partido da classe, que é a base da sua estrutura constitutiva como órgão constituído pela parte mais avançada da classe proletária, não significa que o partido não tenha de estar vinculado por relações próximas com o resto do proletariado – na verdade, exige que o esteja.

11. A natureza destas relações deriva da nossa maneira dialética de ver a formação da consciência de classe e uma organização unitária do partido de classe, que transporta uma vanguarda do proletariado do terreno dos movimentos parciais e espontâneos provocados pelos interesses dos grupos para o terreno da ação proletária geral; e que não o consegue rejeitando esses movimentos elementares, mas realiza a sua integração e ultrapassa-os através de experiências materiais, vivas, encorajando a sua realização, tomando parte ativa neles, acompanhando-os cuidadosamente em todo o seu desenvolvimento.

12. O trabalho de propagação da sua ideologia e de proselitismo para as suas fileiras que o partido continua a fazer é assim inseparável da realidade da atividade e do movimento do proletariado em todas as suas formas variadas. É um erro banal considerar a participação em lutas por resultados limitados e contingentes como contraditória à preparação para a luta revolucionária final e geral. A própria existência do organismo unitário do partido, com as suas condições indispensáveis de clareza de visão programática e solidez da disciplina organizacional, dá a garantia de que as exigências parciais nunca terão o valor de um fim em si, e que a luta para os cumprir será vista apenas como um meio de experiência e formação para uma preparação revolucionária útil e eficaz.

13. Assim, o Partido Comunista participa na vida organizacional de todas as formas de organização económica do proletariado aberta aos trabalhadores (sindicatos, conselhos de fábrica, cooperativas, etc) independentemente das ideologias deles. Para que o partido possa realizar o seu trabalho eficazmente, é uma posição fundamental manter que todos os órgãos desta natureza devem ser unitários, por outras palavras, devem incluir todos os trabalhadores que se encontram numa situação económica específica. O partido participa na vida de tais órgãos organizando aqueles a que os seus membros pertencem em grupos ou células ligadas à organização do partido. Estes grupos, participando na linha da frente nas ações dos órgãos económicos a que pertencem, atraem para si próprios – e portanto para as fileiras do partido político – os elementos que se preparam para isso à medida que a ação se desenvolve. O seu objetivo é conquistar o apoio maioritário e posições de liderança nas suas organizações, tornando-se assim o veículo natural para a transmissão dos slogans do partido. Desta forma, realiza-se um trabalho de conquista e organização, que não se limita à propaganda, proselitismo e campanhas eleitorais internas nas assembleias proletárias, mas que penetra sobretudo no coração da luta e da ação, ajudando os trabalhadores a retirar dela as experiências mais úteis.

14. Todo o trabalho e organização dos grupos comunistas foi concebido para dar ao partido o controlo definitivo sobre os órgãos dirigentes dos organismos económicos, e acima de tudo sobre os executivos sindicais nacionais, que parecem ser o mecanismo mais seguro para os movimentos dirigentes do proletariado não integrados nas fileiras do partido. Uma vez que o Partido Comunista considera da maior importância evitar a cisão dos sindicatos e doutros organismos económicos, enquanto a sua liderança permanecer nas mãos de outros partidos e correntes políticas, não permitirá que os seus membros se submetam no domínio da execução dos movimentos dirigidos por estes organismos contrários às suas disposições no que diz respeito à ação, ao mesmo tempo que leva a cabo as críticas mais abertas sobre a própria ação e sobre o trabalho dos líderes.

15. Para além de participar como foi descrito na vida dos organismos proletários que surgiram naturalmente através da pressão de interesses económicos reais, e facilitando a sua extensão e reforço, o partido esforçar-se-á para realçar, através da sua propaganda, aqueles problemas de interesse real para os trabalhadores que, na evolução das situações sociais, podem dar vida a novos organismos de luta económica. Por todos estes meios, o partido expande e reforça a influência que através de mil laços se estende das suas fileiras organizadas para o proletariado como um todo, aproveitando todas as suas manifestações e potenciais manifestações na atividade social.

16. Totalmente errada é a conceção do organismo do partido que se baseia na exigência de uma perfeita consciência crítica e de um completo espírito de sacrifício em cada um dos seus aderentes individuais, e que limitaria o estrato das massas ligadas ao partido aos sindicatos revolucionários de trabalhadores constituídos no campo económico segundo um critério secessionista e incluindo apenas os proletários que aceitam determinados métodos de ação. Por outro lado, não se pode exigir que numa determinada época ou em vésperas de empreender ações gerais o partido tenha alcançado a condição de incluir sob a sua liderança ou mesmo nas suas fileiras a maioria do proletariado. Tal postulado não pode ser apresentado a priori sem ter em conta o desenvolvimento dialético real do processo de desenvolvimento do partido. Não faz sentido, nem sequer em abstrato, comparar o número de proletários que fazem parte da organização disciplinada e unitária do partido, ou que a seguem, com o número daqueles que estão desorganizados e dispersos, ou que estão em fila de espera em órgãos corporativos que não são capazes de ligação orgânica. Quais são as condições e como podemos estabelecer as condições às quais as relações entre o Partido e a classe trabalhadora devem responder a fim de tornar estas ações possíveis e eficazes, é o que tentaremos definir nas páginas seguintes.


IV. Relações do Partido Comunista com Outros Movimentos Políticos Proletários

17. Uma parte do proletariado está mais hesitante a juntar-se às fileiras do Partido Comunista ou à volta dele, porque está organizado em ou simpatiza com outros partidos políticos. Todos os partidos burgueses têm adeptos proletários, mas aqui estamos principalmente interessados nos partidos social-democratas e nas correntes sindicalistas e anarquistas.

18. Face a estes movimentos deve ser feita uma crítica incessante e serena dos seus programas, demonstrando a sua insuficiência para as necessidades da emancipação proletária. Esta polémica teórica será muito mais eficaz se o partido comunista conseguir mostrar que a crítica que já há tempos fazemos a estes movimentos de acordo com as suas próprias conceções programáticas é confirmada pela experiência proletária. Por esta razão, em polémicas desta natureza, o desacordo entre métodos não deve ser disfarçado, mesmo na parte que não se refere apenas aos problemas do momento, mas reflete o desenvolvimento subsequente da ação do proletariado.

19. Tais polémicas devem, por outro lado, ter o seu reflexo no campo de ação. Os comunistas, ao participarem em lutas mesmo em organismos económicos proletários dirigidos por socialistas, sindicalistas ou anarquistas, não recusarão seguir a sua ação, exceto quando toda a massa das massas se revolta contra ela através do movimento espontâneo. Mas mostrarão como esta ação, num dado momento do seu desenvolvimento, se torna impotente ou utópica devido ao método errado dos líderes, enquanto que o método comunista teria alcançado resultados melhores e mais úteis para os objetivos do movimento revolucionário geral. Nas suas polémicas, os comunistas distinguirão sempre entre os líderes e as massas, deixando a responsabilidade pelos erros e falhas aos primeiros. Não deixarão de criticar com igual vigor o trabalho daqueles líderes que, apesar dos seus sinceros sentimentos revolucionários, defendem táticas perigosas e erróneas.

20. Se é o objetivo essencial do Partido Comunista ganhar influencia entre o proletariado inteiro, aumentando os números das suas fileiras e influência à custa dos partidos e correntes políticas proletárias dissidentes, este objetivo deve ser alcançado através da participação na realidade da luta proletária num terreno que pode ser tanto ou ação comum ou conflito mútuo, desde que as características programáticas e organizacionais do Partido nunca sejam comprometidas.

21. A fim de atrair aderentes desses proletários que suportam outros movimentos políticos, o Partido Comunista não pode usar o método de estabelecer dentro destes grupos frações de comunistas ou simpatizantes comunistas. Nos sindicatos, este método é logicamente aplicado para os penetrar, sem o objetivo de fazer com que os grupos organizativos comunistas dos sindicatos saiam deles numa fração; para os movimentos políticos, tal método comprometeria a unidade orgânica do Partido, pelas razões já expostas sobre o desenvolvimento da organização do Partido.

22. Na propaganda e nas polémica é oportuno ter em conta que nas fileiras sindicalistas e anarquistas há muitos trabalhadores que, embora já percebam a necessidade para uma luta revolucionária unida, continuam enganados por uma reação à degeneração passada dos partidos políticos liderados pelos social-democratas. A amargura da polémica e da luta dirigida contra os partidos socialistas será um elemento de importância fundamental para trazer estes trabalhadores de volta para o terreno revolucionário.

23. A incompatibilidade de um membro do Partido Comunista aderir ao mesmo tempo ao PC e a outro partido é evidente, e estende-se não só aos partidos políticos mas também às organizações que não têm o nome e a organização de um partido apesar de terem carácter político, e a todas as associações que baseiam a aceitação dos seus membros em teses políticas, especialmente a Maçonaria.


V. Elementos das Táticas do Partido Comunista derivados do Estudo da Situação

24. Com os elementos precedentes, foram estabelecidos os critérios gerais que regem as relações organizacionais entre o Partido Comunista e outros organismos proletários, de acordo com a natureza essencial do primeiro. Antes de se chegar aos termos mais táticos da questão, é necessário insistir nesses elementos para a resolução de qualquer problema tático que seja fornecido pela analise da situação momentânea pela qual se está a passar. O programa do Partido Comunista contém a perspetiva de uma série de situações relacionadas com uma série de ações que, no decurso de um processo de desdobramento, lhes são geralmente atribuídas. Existe, portanto, uma ligação próxima entre as diretivas programáticas e as regras táticas. O estudo da situação surge assim como parte essencial da resolução de problemas táticos, considerando que o partido, com base na sua consciência e experiência crítica, já previu como várias situações desenrolariam, e assim definiu as possibilidades táticas correspondentes às ações a serem seguidas nas várias fases. O exame da situação serve para verificar a exatidão das posições programáticas do partido. No dia em que qualquer revisão substancial das mesmas se tornar necessária, o problema será muito mais grave do que qualquer outro que possa ser resolvido através de uma simples mudança tática, e a inevitável retificação da perspetiva programática não pode deixar de ter consequências graves sobre a força e a organização da parte. Esta última deve, portanto, esforçar-se por prever como as situações se poderão desenrolar, a fim de exercer o máximo grau de influência possível sobre elas; mas esperar que surjam situações para as submeter, de forma eclética e descontínua, às orientações e sugestões que suscitaram, é um método característico do oportunismo social-democrata. Se os partidos comunistas fossem forçados a adaptar-se a isto, estariam a suportar a ruína da construção ideológica e militante do comunismo.

25. O Partido Comunista consegue possuir o seu carácter de unidade, e a sua tendência para realizar um processo programático inteiro só se reunir nas suas fileiras a parte do proletariado que, ao organizar-se, superou a tendência para se mover apenas sob os impulsos diretos de situações económicas limitadas. A influência da situação sobre os movimentos gerais do partido deixa de ser direta e determinista, tornando-se uma dependência racional e voluntária, na medida em que a consciência crítica e a iniciativa da vontade, que têm apenas o valor mais limitado para os indivíduos, se realizam na coletividade orgânica do partido. Isto é ainda mais verdade porque o Partido Comunista se apresenta como precursor dessas formas de associação humana que irão retirar da sua transcendência da organização económica sem forma existente a faculdade de dirigir racionalmente – em vez de se submeter passivamente – a peça de teatro dos factos económicos e das suas leis.

26. O partido, contudo, não pode utilizar a sua vontade e a sua iniciativa de forma caprichosa ou arbitrária; os limites que pode e deve impor tanto a um como a outro são-lhe impostos precisamente pelas suas diretivas programáticas, e pelas possibilidades e oportunidades de ação existentes, que podem ser deduzidas de um exame da situação contingente.

27. Depois de examinar a situação, é necessário fazer uma avaliação das forças do partido e da relação entre estas e as dos movimentos inimigos. Acima de tudo, é necessário ter o cuidado de avaliar o grau de apoio que o partido poderia esperar do proletariado se a classe empreendesse uma ação ou se se empenhasse numa luta. Isto significa formar uma ideia precisa das repercussões e ações espontâneas que a situação económica produz entre as massas, e da possibilidade de desenvolver estas ações, como resultado das iniciativas do Partido Comunista e da atitude dos outros partidos. A maneira como a situação económica influencia a combatividade de classe do proletariado são muito complexas, dependendo se estamos a atravessar um período de prosperidade crescente da economia burguesa, ou de crise com consequências acentuadas. Os efeitos destas fases na atividade e na vida organizacional dos organismos proletários são complexos, e não podem ser entendidos só por se iniciar uma analise da situação económica num determinado momento, e deduzir dela o nível de combatividade do proletariado. É necessário ter em conta a influência de todo o curso de situações anteriores, em todas as suas oscilações e variações. Por exemplo, um período de prosperidade pode produzir um poderoso movimento sindical, que numa subsequente crise de imiseração pode ser rapidamente atraído para posições revolucionárias, preservando ao mesmo tempo a amplitude da sua organização de massas e favorecendo assim o sucesso da revolução. Ou um período de imiseração progressiva pode dispersar o movimento sindical, de tal forma que, num período subsequente de prosperidade, se encontra numa fase de construção que não oferece um quadro suficiente para uma organização revolucionária. Estes exemplos, que poderiam igualmente ser invertidos, vão provar que "as curvas da situação económica e da combatividade de classe são determinadas por leis complexas, a segunda pela primeira, mas não são parecidas na forma". À subida (ou queda) da primeira, pode corresponder indiferentemente, em determinados casos, uma subida ou uma queda da segunda.

28. Os elementos integradores deste estudo são extremamente variados. Consistem em examinar as tendências reais envolvidas na constituição e desenvolvimento das organizações do proletariado e as reações – incluindo reações psicológicas – produzidas sobre o mesmo, por um lado, pelas condições económicas, e por outro, pelas atitudes específicas e iniciativas sociais e políticas da classe dominante e dos seus partidos. A analise da situação é efetuada no campo político através da analise das posições e forças das várias classes e partidos em relação ao poder do Estado. A este respeito, é possível classificar as situações em que o Partido Comunista pode encontrar-se a atuar em fases fundamentais; situações que, no curso normal das coisas, o levam a fortalecer-se, alargando a sua filiação, e ao mesmo tempo definir cada vez mais precisamente os limites do seu campo tático. Estas fases podem ser especificadas como se segue: poder feudal absolutista - poder burguês democrático - governo social-democrata - período intermédio de guerra social em que as bases do Estado se tornam instáveis - poder proletário na ditadura dos Conselhos. Num certo sentido, a questão da tática consiste não só em escolher o rumo certo para uma ação eficaz, mas também em impedir que a atividade do partido ultrapasse os limites apropriados, e em voltar a métodos que correspondam a situações passadas – cuja consequência seria deter o processo de desenvolvimento do partido, em detrimento da sua preparação revolucionária. As considerações que se seguem referir-se-ão sobretudo à ação do partido na segunda e terceira das fases políticas acima mencionadas.

29. A posse pelo Partido Comunista de um método crítico e de uma consciência que leva à formulação do seu programa é uma condição da sua vida orgânica. Por essa mesma razão, o partido e a Internacional Comunista não podem limitar-se a estabelecer a maior liberdade e elasticidade de táticas, confiando a sua execução aos órgãos dirigentes relevantes, sujeitos ao exame da situação, no seu julgamento. Uma vez que o programa do partido não pode ser caracterizado como um objetivo simples a ser alcançado por qualquer meio, mas sim como uma perspetiva histórica de caminhos e pontos de chegada mutuamente relacionados, as táticas adotadas em situações sucessivas devem estar relacionadas com o programa, pelo que as normas táticas gerais adotadas em situações sucessivas devem ser claramente especificadas dentro de limites não demasiado rígidos, tornando-se mais e mais claras e tendo menos oscilações à medida que o movimento ganha em força e se aproxima da vitória final. Só um critério como este pode permitir-nos aproximar-nos cada vez mais do nível otimizado de genuína centralização dentro dos partidos e da Internacional necessário para dirigir eficazmente a ação; de modo a que as ordens emanadas do centro sejam aceites de boa vontade, não só dentro dos partidos comunistas mas também dentro do movimento de massas que conseguiram organizar. Não se deve, contudo, esquecer que, uma vez aceite a disciplina orgânica do movimento, há ainda o fator de iniciativa por parte de indivíduos e grupos que depende da forma como as situações se desenvolvem e do que delas resulta; e de um avanço contínuo e lógico em termos de experiências, e de mudanças de rumo a seguir, para descobrir a forma mais eficaz de combater as condições de vida impostas ao proletariado pelo sistema existente. Assim, cabe ao partido e à Internacional explicar a totalidade das suas regras táticas gerais de uma forma sistemática – uma vez que poderá eventualmente recorrer aos que se encontram dentro das suas próprias fileiras, e dentro dos estratos do proletariado que os rodeiam, para pôr em prática estas regras táticas e fazer sacrifícios em seu nome – mostrando como tais regras e perspetivas de ação constituem o caminho inevitável para a vitória. É, portanto, uma necessidade prática e organizacional, e não o desejo de teorizar e esquematizar a complexidade das manobras que o partido pode ser chamado a empreender, que nos leva a estabelecer os termos e limites das táticas do partido. E é por estas razões inteiramente concretas que o partido deve tomar decisões que parecem restringir as suas possibilidades de ação, mas que por si só fornecem uma garantia da unidade orgânica da sua atividade na luta proletária.


VI. Atividade Tática “Indireta” do Partido Comunista

30. Quando faltam as condições para uma atividade tática que possa ser definida como direta, tendo o carácter de um ataque ao poder burguês com as forças à disposição do Partido Comunista, e que será discutida a seguir, o partido pode e deve – longe de se restringir a um trabalho puro e simples de proselitismo e propaganda – influenciar os acontecimentos através das suas relações e pressões sobre outros partidos e movimentos políticos e sociais, com o objetivo de determinar a evolução da situação numa direção favorável aos seus próprios objetivos, e de forma a acelerar o momento em que será possível uma ação revolucionária resoluta.

As iniciativas e atitudes a adotar em tal caso constituem um problema delicado, e a condição básica que deve ser estabelecida de que não devem em caso algum estar ou parecer estar em contradição com as exigências a longo prazo da luta específica do partido, de acordo com o programa do qual é o único proponente e pelo qual no momento decisivo o proletariado terá de lutar. Qualquer posição que cause ou implique a despromoção a um nível secundário da afirmação completa desta propaganda, que não só tem valor teórico, mas deriva sobretudo de posições do dia-a-dia adotadas no âmbito da luta proletária propriamente dita, e que tem de acentuar continuamente a necessidade do proletariado abraçar o programa e os métodos comunistas; qualquer posição que fizesse com que o alcance de determinados pontos de referência contingentes parecesse ser um fim em si mesmo e não um meio de avançar para a vitória final, levaria a um enfraquecimento da estrutura do partido e da sua influência na preparação das massas para a revolução.

31. Na situação histórico-política que corresponde ao poder burguês democrático, há geralmente uma divisão no campo político em duas correntes ou "blocos" – a esquerda e a direita – que competem entre si para governar o Estado. O bloco de esquerda é normalmente apoiado mais ou menos abertamente pelos partidos social-democratas, que favorecem as coligações por princípio. A forma como este concurso se desenrola não é uma questão de indiferença para com o Partido Comunista, tanto porque diz respeito a pontos e exigências que afetam as massas proletárias e atraem a sua atenção, como porque o seu estabelecimento numa vitória da esquerda pode realmente suavizar o caminho para a revolução proletária. Ao examinar o problema da aconselhabilidade tática de coligações com os elementos políticos de esquerda – e querendo evitar todo o apriorismo falsamente doutrinário ou estupidamente sentimental e puritano – é preciso sobretudo ter em conta que o Partido Comunista goza de liberdade de movimento na medida em que é capaz de prosseguir no seu processo de organização e preparação com continuidade, do qual retira essa influência sobre as massas que lhe permite chamá-las à ação. Não pode propor uma tática com um critério ocasional e transitório, considerando que será capaz, posteriormente, no momento em que tal tática deixar de ser aplicável, de executar uma mudança brusca de frente, transformando os aliados de ontem em inimigos. Se não se quiser comprometer os laços com as massas e o seu reforço no preciso momento em que é mais essencial que estes se manifestem, será necessário perseguir em todas as declarações e atitudes públicas e oficiais uma continuidade de método e intenção que seja estritamente coerente com a propaganda e preparação ininterruptas para a luta final.

32. Uma tarefa essencial do partido comunista, ao preparar o proletariado ideológica e praticamente para a luta revolucionária para a sua ditadura, é a de se envolver numa crítica implacável ao programa da esquerda burguesa e de qualquer programa que procure resolver problemas sociais no quadro das instituições democráticas burguesas parlamentares. A substância dos desacordos entre a direita e a esquerda burguesa, na sua maioria, só afeta o proletariado na medida em que são falsificações demagógicas, que naturalmente não podem ser desarmadas apenas por críticas teóricas, mas devem ser reveladas pelo que são na prática, no meio da luta. Em geral, as exigências políticas da esquerda, cujos objetivos certamente não incluem de modo algum passo extra numa subida para algum patamar intermediário entre o sistema económico e político do capitalismo e o do proletariado, correspondem a condições que dão mais espaço de respiração ao capitalismo moderno e asseguram a sua defesa mais eficaz, tanto no seu valor intrínseco como porque tendem a dar às massas a impressão de que as instituições existentes podem ser utilizadas para alcançar a sua emancipação. Isto aplica-se às exigências de extensão do sufrágio e de outras garantias e melhorias do liberalismo, tal como à luta anticlerical e a toda a bagagem da política "maçónica". As reformas legislativas nos domínios económico ou social têm um valor semelhante: ou não serão levadas a cabo, ou só o serão na medida em que criem um obstáculo à dinâmica revolucionária das massas e com essa intenção.

33. O advento de um governo de esquerda burguês ou mesmo social-democrata pode ser visto como preliminar à luta final pela ditadura do proletariado; mas não no sentido de que a sua atividade prática criaria condições prévias úteis de tipo económico ou político, e certamente não na expectativa de que permitiriam ao proletariado uma maior liberdade de organização, preparação e participação na ação revolucionária. O Partido Comunista sabe e tem o dever de proclamar, pela força da razão crítica e da experiência sangrenta, que estes governos só respeitarão a liberdade de movimento do proletariado enquanto este o reconhecer e defender como seus próprios representantes, enquanto que, confrontados com um ataque das massas contra a máquina do Estado democrático, responderiam com a reação mais feroz. É assim num sentido muito diferente que o advento de tais governos pode ser útil: na medida em que, isto é, a sua atividade permite ao proletariado deduzir por experiência dura que só a instalação da sua ditadura pode realmente derrotar o capitalismo. Obviamente, a exploração de tal experiência só será eficaz na medida em que o Partido Comunista tenha denunciado antecipadamente o fracasso do governo, e preservado uma forte organização independente em torno da qual o proletariado possa reagrupar-se, depois de ser forçado a abandonar os grupos e partidos que teria apoiado em parte na sua experiência governamental.

34. Assim, uma coligação do Partido Comunista com partidos da esquerda burguesa ou da social-democracia não só prejudicaria a preparação revolucionária e dificultaria a utilização de uma experiência governamental de esquerda, mas também, na prática, adiaria normalmente a vitória da esquerda sobre o bloco da direita. Estes são rivais para o apoio do centro burguês, que se move para a esquerda porque está justamente convencido de que a esquerda não é menos anti-revolucionária e conservadora do que a direita, propondo concessões que são quase exclusivamente apenas aparentes e só minimamente eficazes a fim de parar o movimento revolucionário que luta contra as instituições idênticas aceites tanto pela direita como pela esquerda. Assim, a presença do Partido Comunista numa coligação de esquerda perderia mais apoio a esta última, sobretudo no terreno da luta eleitoral e parlamentar, do que o seu apoio, e toda a experiência seria provavelmente atrasada em vez de acelerada por uma tal política.

35. Por outro lado, o Partido Comunista não ignora o facto inegável de que as exigências em torno das quais o bloco de esquerda concentra a sua agitação atraem o interesse das massas e, na sua formulação, correspondem frequentemente às suas necessidades reais. O Partido Comunista não defenderá a tese superficial de que tais concessões devem ser rejeitadas com o argumento de que só a conquista final e total revolucionária merece os sacrifícios do proletariado. Não faria sentido proclamar isto, uma vez que o único resultado seria que o proletariado estaria certamente atrás dos democratas e social-democratas e acabaria por ser escravizado por eles. O Partido Comunista apelará assim aos trabalhadores para que aceitem as concessões da esquerda como uma experiência, mas salientará na sua propaganda a sua previsão pessimista quanto ao resultado dessa experiência, e a necessidade do proletariado, se não quiser ser arruinado por esta aventura, de não apostar a sua independência organizacional e política. O Partido Comunista exigirá às massas que exijam aos partidos social-democratas – que garantem a possibilidade de as promessas da esquerda burguesa serem cumpridas – que honrem os seus compromissos, e, com as suas críticas independentes e incessantes, preparar-se-á para colher o resultado negativo de tais experiências, mostrando como toda a burguesia está, de facto, reunida numa frente unida contra o proletariado revolucionário e como os partidos que se auto-denominam partidos de trabalhadores, mas que apoiam a coligação com parte da burguesia, são meramente seus cúmplices e agentes.

36. As reivindicações apresentadas pelos partidos de esquerda, e especialmente pelos social-democratas, são frequentemente do tipo que é apropriado apelar o proletariado a avançar diretamente para as implementar; uma vez que se uma luta começasse, a inadequação dos meios pelos quais os social-democratas se propunham chegar a um programa de benefícios para o proletariado tornar-se-ia imediatamente evidente. O Partido Comunista destacaria então essas mesmas exigências, tornando-as mais específicas, e elevá-las-ia como uma bandeira de luta para todo o proletariado, apelando a este último a obrigar os partidos que falam de tais exigências puramente por razões oportunistas a demonstrar o seu empenho em conquistá-las. Sejam estas exigências de natureza económica ou política, o Partido Comunista irá propo-las como objetivos de uma coligação de organismos sindicais, evitando a criação de comités para liderar a luta e a agitação em que o Partido Comunista estaria representado e envolvido ao lado de outros partidos políticos; sendo o objetivo sempre concentrar a atenção das massas no distinto programa comunista, e manter a sua própria liberdade de movimento para poder escolher o momento certo para alargar a sua esfera de atividade quando necessário, expulsando os outros partidos que revelaram a sua impotência e foram abandonados pelas massas. A frente sindical única, entendida desta forma, oferece a possibilidade de ação unida pela classe trabalhadora inteira, das quais o método comunista só pode sair vitorioso, sendo o único método capaz de dar ao movimento unitário do proletariado qualquer substância real, livre de qualquer co-responsabilidade pela atividade dos partidos que expressam o seu apoio verbal à causa do proletariado apenas por oportunismo, e com intenções contra-revolucionárias.

37. A situação que estamos a considerar pode tomar a forma de um ataque da direita burguesa a um governo democrático ou social-democrata. Mesmo neste caso, a posição do Partido Comunista não pode ser a de proclamar solidariedade com governos deste tipo, uma vez que não podemos apresentar ao proletariado como um ganho a ser defendido uma ordem política cuja experiência saudámos, e estamos a seguir, com a intenção de acelerar no proletariado a convicção de que não se trata de um projecto a seu favor, mas sim de um projecto contra-revolucionário.

38. Pode acontecer que o governo de esquerda permita que as organizações de direita, os gangues brancos burgueses, se envolvam em ações dramáticas contra o proletariado e as suas instituições, e não só não pede o apoio do proletariado mais ainda insiste que ele não tem o direito de responder com resistência organizada armada. Neste caso, os comunistas demonstrarão que não passa de uma cumplicidade real, ou mesmo uma divisão de funções entre o governo liberal e as forças reacionárias irregulares. O burguês deixa então de discutir se as canções de embalar democráticas e reformistas ou se a repressão violenta lhe convém uma mais que a outra, e utiliza-as ambas ao mesmo tempo. Nesta situação, o verdadeiro e mais mortal inimigo da preparação revolucionária é o lado liberal no governo: engana o proletariado para tomar o seu partido em nome da legalidade, de modo a poder torná-lo indefeso e desorganizado, e para o derrotar, em colaboração total com os brancos, no dia em que o proletariado se vê forçado pelos acontecimentos a lutar contra o aparelho legal que preside à sua exploração.

39. Outra hipótese é que o governo e os partidos de esquerda que o compõem convidem o proletariado a participar na luta armada contra um ataque da direita. Este convite é inevitavelmente uma armadilha, e o Partido Comunista irá responder-lhe proclamando que armas nas mãos dos proletários significa o advento do poder e do Estado proletário, e o desarmamento da máquina burocrática e militar tradicional do Estado, uma vez que este nunca seguirá as ordens de um governo de esquerda que alcançou o poder por meios legalitários quando convoca o povo à luta armada, e uma vez que só a ditadura proletária poderia conferir um carácter estável a uma vitória sobre os gangues brancos. Como consequência, nenhum "lealismo" deveria ser proclamado ou praticado em relação a tal governo e, mais importante de tudo, as massas terão de estar conscientes de que a consolidação do poder deste último com a ajuda do proletariado contra uma ascensão da direita ou tentativa de golpe de Estado seria muito perigosa, porque significaria a consolidação da própria organização que se oporá ao avanço revolucionário do proletariado quando esta se tiver tornado a sua única saída; se o controlo da organização armada do Estado tivesse sido deixado nas mãos dos partidos democráticos no governo, por outras palavras, se o proletariado tivesse posto as suas armas de lado sem as ter utilizado para derrubar as formas políticas e estatais existentes, contra todas as forças da classe burguesa.


VII. Atividade Tática “Direta” do Partido Comunista

40. Noutros casos, porém, exigências imediatas e prementes da classe trabalhadora, quer reivindicativas quer defensivas, acham a esquerda e os partidos social-democratas indiferentes. Não tendo à sua disposição forças suficientes para chamar as massas diretamente a essas conquistas, devido à influência sobre elas dos social-democratas, o Partido Comunista – evitando oferecer qualquer aliança aos social-democratas, proclamando de facto que eles traem mesmo os interesses contingentes e imediatos dos trabalhadores – ao formular estes objetivos de luta proletária invocará uma frente única proletária realizada no terreno sindical para a sua realização. A implementação desta frente encontrará nos seus postos os militantes comunistas nos sindicatos; mas ao mesmo tempo deixará ao partido a possibilidade de intervir quando a luta se desenvolver mais, contra o que os social-democratas inevitavelmente lutaram contra nós – e por vezes os sindicalistas e os anarquistas também. Por outro lado, a recusa dos outros partidos proletários em implementar uma frente sindical única para estes objetivos será utilizada pelo Partido Comunista para derrubar a sua influência – e não apenas com críticas e propaganda que mostra como o que está a acontecer é uma cumplicidade inegável com a burguesia, mas sobretudo através da participação na linha da frente nas ações parciais do proletariado que a situação não deixará de provocar, fazendo-o com base naqueles pontos fortes precisos para os quais o partido tinha proposto a frente sindical única de todas as organizações locais e de todas as categorias, e tirando daí uma demonstração concreta de que os líderes social-democratas, opondo-se à extensão da atividade, estão a preparar a sua derrota. Naturalmente, o Partido Comunista não se limitará a esta tarefa de atribuir a responsabilidade por uma tática incorreta aos outros partidos; mas, com extrema cautela e disciplina rigorosa, estudará se não chegou o momento de ultrapassar a resistência dos contra-revolucionários, quando no decurso da ação se produz uma situação entre as massas, de tal forma que estas seguiriam um apelo à ação do Partido Comunista contra qualquer resistência. Uma iniciativa deste tipo só pode ser central, e nunca é admissível que seja tomada localmente por organismos do Partido Comunista ou por sindicatos controlados pelos comunistas.

41. A expressão de táticas "diretas" é aplicada mais especialmente à atividade do partido numa situação que lhe sugere que deve tomar a iniciativa independente num ataque ao poder burguês, a fim de o derrubar ou de lhe dar um golpe que o enfraquecerá gravemente. O partido, para poder empreender uma ação deste tipo, deve ter à sua disposição uma organização interna sólida, que dê absoluta certeza de uma disciplina rigorosa às ordens da liderança central. Deve, além disso, poder contar com a mesma disciplina das forças sindicais que lidera, de modo a ter a certeza do apoio de um largo segmento das massas. Também necessita de um tipo de organização militar de certo grau de eficácia, e de todo o equipamento para atividades ilegais – sobretudo para comunicações e formas de contacto que não possam ser controladas pelo governo burguês – que lhe permita preservar com segurança a sua liderança do movimento na situação previsível de ser ilegalizado ao abrigo de disposições de emergência. Mas acima de tudo, ao tomar uma decisão para uma ação ofensiva da qual pode depender o destino de um trabalho de preparação totalizante e extremamente longo, o Partido Comunista deve basear-se num estudo da situação que não lhe garanta só a disciplina das forças diretamente organizadas e lideradas por ele; que não o encoraje apenas a prever que os laços que melhor o ligam às massas proletárias não irão romper na luta; mas que lhe dá confiança de que o apoio do partido entre as massas e a amplitude da participação do proletariado no movimento irá crescer progressivamente no decurso da ação, uma vez que a ordem para tal servirá para despertar e colocar em funcionamento tendências naturalmente difundidas nas camadas mais profundas das massas.

42. Nem sempre será possível que um movimento geral para uma tentativa de derrubar o poder burguês iniciado pelo Partido Comunista seja anunciado como tendo este objetivo, abertamente. A diretiva para envolver a luta pode (exceto no caso de uma precipitação excecional de situações revolucionárias que agitam o proletariado) referir-se a reivindicações fortes que são algo menos do que a conquista do poder proletário, mas que, parcialmente, só se podem realizar através desta vitória suprema – mesmo que as massas só as vejam como exigências imediatas e vitais: objetivos que, de maneira limitada, enquanto poderem ser realizados por um governo que ainda não é o da ditadura do proletariado, deixam aberta a possibilidade de parar a ação num determinado ponto que deixe intacto o nível de organização e combatividade das massas, se parecer impossível continuar a luta até ao fim sem comprometer, através do resultado, as condições para a retomar efetivamente em situações subsequentes.

43. Nem é sequer para excluir a opção que o Partido Comunista possa achar oportuno dar a palavra para uma ação diretamente, mesmo sabendo que não se trata de chegar à suprema conquista revolucionária, mas apenas de travar uma batalha da qual o inimigo sairá com o seu prestígio e a sua organização danificada, e o proletariado materialmente e moralmente reforçado. Neste caso, o partido chamará as massas à luta, formulando uma série de objetivos que podem ser de facto alcançados, ou parecer mais limitados do que aqueles que o partido propõe-se a alcançar se a luta concluir com sucesso. Tais objetivos, sobretudo no plano de ação do partido, devem ser organizados em progressão, de modo que a realização de cada um deles constitua uma posição de possível reforço através de uma paragem no caminho para as sucessivas lutas. É necessário evitar o mais possível a tática desesperada de se lançar na luta em condições em que só o supremo triunfo da revolução é que pode ser considerado uma conclusão favorável de qualquer maneira, enquanto que, no caso contrário, há uma certeza de derrota e dispersão das forças proletárias durante um período que é impossível de prever. Os objetivos parciais são assim indispensáveis para manter o controlo seguro da ação, e formulá-los não entra em conflito com as críticas ao seu conteúdo económico e social específico, na medida em que as massas podem acolhê-los não como oportunidades de luta que são um meio e uma preliminar à vitória final, mas como fins de valor intrínseco com os quais se devem satisfazer uma vez vencidos. Naturalmente, é sempre um problema delicado e terrível fixar estes objetivos e limites à ação; é através do exercício da sua experiência e da seleção dos seus líderes que o partido se tempera para esta responsabilidade suprema.

44. O partido deve evitar defender ou espalhar a ilusão de que, numa situação de estagnação da combatividade do proletariado, é possível provocar o despertar das massas para a luta através do simples efeito do exemplo dado por um grupo de homens corajosos que se lançam em combate e tentam golpes de Estado contra instituições burguesas. As razões pelas quais o proletariado pode levantar-se de uma situação de depressão devem ser procuradas no desenrolar real da situação económica; as táticas do partido podem e devem contribuir para este processo, mas com um trabalho muito mais profundo e contínuo do que os atos dramáticos de uma vanguarda atirada para o ataque.

45. O partido, contudo, usará a sua força e organização para ações que sejam devidamente controladas tanto na sua conceção como na sua execução, no que diz respeito a grupos armados, organizações da classe trabalhadora e multidões de rua, que têm um valor demonstrativo e defensivo ao dar às massas uma prova concreta de que é possível, com organização e preparação, enfrentar certas formas de resistência e cercas ofensivas por parte da classe dominante, quer sob a forma de atentados terroristas por grupos armados reacionários, quer sob a forma de obstrução policial de determinados tipos de organização e atividade proletária. O objetivo não será o de provocar uma ação geral, mas o de elevar novamente as massas deprimidas e desmoralizadas ao mais alto nível de combatividade, com uma série de ações destinadas a despertar nelas sentimentos e uma necessidade de revolta.

46. O partido evitará completamente, em tais ações locais, qualquer infração à disciplina interna dos organismos sindicais por parte dos órgãos locais e dos militantes dentro destes que são membros do Partido Comunista, uma vez que estes nunca devem ser autorizados a romper com os órgãos executivos nacionais liderados por outros partidos. Pois, como já foi dito, devem servir de base indispensável para conquistar esses órgãos para o partido. O Partido Comunista e os seus membros irão, no entanto, seguir ativamente as massas e oferecer-lhes toda a sua ajuda quando responderem através de um impulso espontâneo a provocações burguesas, mesmo que ultrapassem os limites da disciplina aos critérios da inação e passividade dos líderes sindicais reformistas e oportunistas.

47. Na situação que é característica do momento em que o poder do Estado é abalado até aos seus fundamentos, e está prestes a cair, o Partido Comunista, no meio da manifestação total das suas forças e da agitação das massas em torno da sua bandeira de exigências máximas, não perderá a possibilidade de influenciar momentos de equilíbrio instável na situação, aproveitando-se de todas as forças que momentaneamente possam estar a agir em harmonia com a sua própria atividade independente. Quando for absolutamente certo que ganhará o controlo do movimento assim que a organização tradicional do Estado se desmoronar, poderá recorrer a acordos transitórios e contingentes com outros movimentos que tenham forças à sua disposição no campo da luta – mas sem elevar tais alianças a temas de propaganda ou slogans ditos pelo partido às massas. O sucesso será, em qualquer caso, o único critério para avaliar a correção de ter cedido a tais contactos, e para julgar que cálculos devem ser feitos a este respeito. Não são os preconceitos teóricos ou as preocupações éticas e estéticas que ditam as táticas do Partido Comunista; toda a sua tática é ditada unicamente pela real adequação dos meios ao fim e à realidade do processo histórico, aplicando essa síntese dialética de doutrina e ação que é o património de um movimento destinado a desempenhar o papel principal numa imensa renovação social, o comandante da grande guerra revolucionária.


VIII. O Partido Comunista Italiano e o Momento Presente

48. A fase, e portanto o problema, da formação do partido foi agora completamente superado em Itália. Com o Congresso Socialista de Milão – antes do qual, não foi definitivamente excluída a possibilidade de uma modificação substancial da base constitutiva do Partido Comunista Italiano, através da fusão com uma fação de esquerda do Partido Socialista, que teria assumido o significado de um elemento essencial e integrador, mas com o Congresso de Milão e as suas decisões, esta possibilidade desapareceu por completo. Parece agora evidente que apenas a fação de extrema esquerda que se separou em Livorno poderia constituir o núcleo criativo do partido. E é agora igualmente claro que o seu desenvolvimento progressivo normal não irá, no futuro, proceder através de se aproximar com grupos organizados que se separem de outras formações políticas; em vez disso, irá proceder unicamente através do recrutamento de indivíduos que, ao entrarem nas suas fileiras concebidas precisamente para as receber, não irão introduzir desordens ou mudanças, mas simplesmente uma maior força – em número, e portanto em ação.

49. O Partido, portanto, libertado dos cuidados inerentes a cada período de iniciação, deve dedicar-se completamente ao seu trabalho de penetração cada vez mais extensa entre as massas, estabelecendo e multiplicando os órgãos de ligação entre elas e o próprio Partido. Nenhum campo de atividade proletária deve permanecer desconhecido para os comunistas: os sindicatos, as cooperativas, as sociedades de apoio mutuo, etc devem ser penetradas cada vez mais profundamente – com o estabelecimento de grupos comunistas e a sua vinculação – e conquistados com as diretivas do Partido. Enquanto os vários Comités de Ajuda, para as vítimas políticas, para a Rússia, etc., devem ver os comunistas representados nele e gozar da sua colaboração. Isto, porém, deve-se simplesmente ao facto de o partido não dever permanecer indiferente a qualquer instrumento que o coloque em contacto mais direto com o proletariado; e porque deve ter o cuidado de satisfazer as necessidades contingentes deste último. Nunca se deve estabelecer relações duradouras com outros partidos políticos, mesmo subversivas.

50. Em relação a estes últimos, as polémicas destinadas a clarificar a nossa atitude aos olhos dos trabalhadores, e a quebrar a ambiguidade das suas declarações programáticas, devem continuar sem qualquer pausa. Socialistas e libertários perseguem o enfraquecimento proletário de duas formas diferentes na Itália de hoje: a primeira com as suas táticas de submissão e desarmamento face ao ataque do capitalismo; a segunda com a sua luta contra a República dos Soviéticos e contra o princípio da ditadura do proletariado, ao qual contrapõem a fantasia de uma liberdade abstrata que é puramente teorética e sem qualquer conteúdo material.

A situação italiana atual, caracterizada pela ofensiva da burguesia mais e mais vasta e complexa, oferece diariamente mil documentos infelizes para as nossas polémicas contra os anarquistas e social-democratas, que dão provas manifestas da sua falta de compreensão do momento. Porque isto, em vez de representar qualquer coisa excecional e transitória, é na realidade uma etapa natural e previsível do desenvolvimento da ordem capitalista: uma manifestação específica da função e dos objetivos do Estado democrático.

51. Hoje, em Itália, pode-se perceber uma involução característica do Estado no que diz respeito ao seu modo de funcionamento. O período constitutivo do Estado burguês, que marcou uma progressiva centralização de todas as funções de governo dentro da organização de uma autoridade central, encontra a sua contrapartida e a sua negação no período presente, em que a união estável de todos os poderes – anteriormente afastados da decisão arbitrária de indivíduos – agora desmorona e dispersa-se. Os poderes do Estado são mais uma vez exercidos individualmente por cada pessoa privada. E já não seria sequer necessário que o Estado colocasse os seus órgãos explicitamente – embora o faça – à disposição da conservação burguesa: do exército à magistratura, do Parlamento aos funcionários do poder executivo. Para cada um deles, na pessoa dos seus profissionais, utiliza os seus próprios poderes para o mesmo fim, de forma autónoma e incontrolável.

A fim de evitar que uma inesperada paragem nesta crise de dissolução permita ao Estado recuperar qualquer controlo sobre a atividade dos indivíduos, a classe burguesa procede precipitadamente à criação de órgãos suplementares. Estes, perfeitamente de acordo com os órgãos estatutários – quando estes funcionam de acordo com os desejos de conservação explícitos – em vez disso, contrapõem-se a esses órgãos e substituem-nos sempre que estes mostram sinais de se afastarem da maior aquiescia (Comités Civis, Comités de Defesa, etc.).

Invocar, como fazem os social-democratas, o regresso à autoridade do Estado e ao respeito pela lei mostra que, embora afirmem que o Estado parlamentar democrático é um Estado de classe, não conseguem compreender que, precisamente por esta razão, está hoje a cumprir a sua tarefa essencial – violando as leis escritas que eram necessárias à sua consolidação progressiva, mas que agora prejudicariam a sua conservação.

52. A situação italiana atual contém sinteticamente dentro de si todos os elementos constitutivos do golpe de Estado, embora o facto probatório externo do ato militar não tenha ocorrido. A ocorrência mais e mais frequentes de episódios de violência que sucessivamente anulam as condições normais da vida social duma classe inteira de cidadãos; a sobreposição da vontade caprichosa de grupos e indivíduos sobre as disposições da lei escrita; a imunidade garantida a tais grupos e indivíduos; e a perseguição ordenada aos seus inimigos – tudo isto produziu os mesmos resultados que teria sido produzido por um único ato mais grandioso e mais violento, que pôs em movimento mais numerosas forças em simultâneo.

A classe burguesa está perfeitamente consciente deste estado de coisas, mas os seus interesses exigem que a aparência exterior de uma democracia formal não seja destruída; e que a economia geral não seja profundamente abalada por uma mudança violenta que, no final, não ofereceria maior salvaguarda para o seu privilégio do que aquela de que goza hoje. Assim, é provável que, tal como a burguesia está dividida na análise da necessidade disto, e ainda sendo suficientemente poderosa para a quebrar, a burguesia oporia-se a um golpe militar perturbador motivado quase exclusivamente por ambições pessoais. Nenhuma forma de governo nova poderia desprezar a liberdade mais de que aquela que existe agora; pelos direitos já conquistados e sancionados; pelas vidas dos trabalhadores. Só num aperfeiçoamento do Estado democrático, tornando-o mais capaz de esconder a verdadeira substância do regime ditatorial da burguesia, poderá encontrar o seu objetivo. Isto será alcançado com a formação de um governo social-democrata.

53. A situação italiana atual fertiliza e concretiza, precisamente, esta nova etapa do martírio do proletariado. O trabalho para este resultado prossegue de dois lados: uma forte corrente no Partido Socialista e os partidos burgueses esquerdistas estão igualmente a testar o terreno de modo a encontrar o local mais favorável para um encontro e uma aliança. Ambos, de facto, motivam as suas ações só pela necessidade de encontrar e construir uma defesa contra a violência destrutiva fascista. E neste terreno procuram o assentimento de todas as partes subversivas, assim exigindo o fim das polémicas e dos ataques mútuos.

Se um governo social-democrata tivesse a força para lutar e derrotar o fascismo – o que duvidamos fortemente, tanto através das nossas convicções teóricas como por causa dos exemplos da história recente – e se por isso se tornasse necessário preparar um terreno favorável à sua formação, este seria ainda mais fácil e rapidamente constituído na medida em que os comunistas continuassem a sua atual polémica determinada e incansável contra o Partido Socialista. O ataque dos comunista dá ao Partido Socialista crédito aos olhos burgueses, como alvo de violência revolucionária e como impedimento e obstáculo ao desenrolar da luta de classes, tornando assim mais provável um acordo e uma aliança entre eles. Pois não se deve esquecer que grupos de esquerda da burguesia começaram a apresentar a colaboração socialista como alcançável em Itália a partir do momento em que o Livorno se separou libertou o Partido Socialista de qualquer corrente comunista. O fim da luta entre comunistas e socialistas devolveria a estes últimos a posição ostensiva, embora falsa, de ser favorável à doutrina e prática da III Internacional; impediria assim o reforço dessa confiança que é a condição prévia para a criação do bloco social-democrata.

Assim, a intransigência mais absoluta para com os partidos subversivos deveria ser praticada no campo da luta política, permitindo mesmo a perspetiva – que para nós é falaciosa – de que uma mudança de homens num Estado formalmente inalterado poderia ocorrer num sentido que favoreceria o proletariado.

54. Quanto ao fascismo, o PCdaI., embora considerando-o como uma consequência inevitável do desenvolvimento do regime, não tira a conclusão de que uma atitude de passividade inerte deve ser assumida em relação a ele. Combater o fascismo não significa acreditar que é possível anular uma função da sociedade burguesa sem destruir a existência da sociedade burguesa inteira; nem iludir-se de que o fascismo pode ser derrotado em si mesmo, como um episódio cortado e isolado da atividade ofensiva global do capitalismo. Em vez disso, visa tornar menos graves e dolorosos os danos que a violência inimiga inflige ao espírito combativo e inabalável da classe trabalhadora.

55. O PCdaI não exclui mas tem em mente a possibilidade de que da situação atual, instável possa surgir a oportunidade de uma ação violenta por parte de uma parte da burguesia. Preparando, portanto, um mínimo de meios necessários para enfrentar e ultrapassar esta situação, assume em relação ao problema da ação direta uma atitude de preparação.

A crise mundial da economia capitalista teve uma influência negativa sobre o avanço do proletariado, que viu as suas organizações mais sólidas serem quebradas. Pois não tinham previsto a crise, e por isso não se tinham preparado para a superar vitoriosamente. O partido acredita que hoje é necessário reconstruir essa antiga solidez, guiado pela convicção de que, numa situação análoga à que atravessou recentemente, um proletariado solidamente organizado e liderado por um partido revolucionário poderia justamente passar para o ataque. Assim, construir este partido e alargar a sua influência sobre as massas; dar coerência, disciplina e preparação aos seus próprios membros; atrair por detrás dele camadas cada vez mais amplas da classe trabalhadora: estas são as tarefas essenciais dos comunistas italianos, que as cumprirão tomando como norma as teses sobre as várias questões (sindicais, agrícolas, etc.) que serão aprovadas e discutidas pelo Congresso presente.

 

 

  


Teses Sobre a Questão Agrária

- Tarefas agrárias da ditatura do proletariado
II  - O P.C. e os camponeses na fase da luta pela conquista do poder
III  - Como o proletariado agrário está organizado
IV  - Organização dos semi-proletarios
- Organização de pequegnos agricultores
VI - Agricultores Proprietários Médios
VII  - A proprietade dos latifundiários
VIII   - Secçáo agrária do P.C.

 

 
I. Tarefas agrárias da ditatura do proletariado

1. O comunismo quer organizar, sistematicamente, à escala mundial, a produção e distribuição de produtos, com o objetivo de utilizar totalmente os recursos da natureza, de reduzir progressivamente o esforço de trabalho necessário na existência da humanidade, e de formar uma sociedade sem classes, em que cada um dá de acordo com a sua capacidade e recebe de acordo com as suas necessidades. Desta revolução beneficiarão principalmente as massas de trabalhadores rurais, precisamente porque na ordem capitalista da sociedade atual eles vivem num nível de qualidade de vida muito baixo.

2. A organização sistemática da produção exige a máxima divisão e especialização, tanto nacional como internacional, do trabalho, e portanto do trabalho coletivo. Mas as condições materiais e técnicas necessárias ao trabalho coletivo não existem em todos os ramos de produção e não podem existir simultaneamente em todos os ramos, enquanto o capitalismo estiver em vigor, o que, devido à sua maneira de funcionamento orgânica sob a pressão do interesse individual e da concorrência, deve necessariamente levar à prevalência de alguns grupos de interesses em detrimento de outros. Portanto, a condição indispensável para a criação, em todos os ramos de produção, das condições técnico-materiais que tornarão possível a sua socialização e organização à escala nacional e internacional é o derrube político e económico do capitalismo e a transferência de poder para o proletariado através da revolução proletária.

3. Existe assim um período de transição entre capitalismo e comunismo, em que a classe dominante atual, os capitalistas, desaparece através da socialização da grande indústria, banca, transportes, etc., e no seu lugar a dicção da sociedade passa para o proletariado das empresas socializadas. Neste período há ainda restos mais ou menos consideráveis de produção privada, ao pé de formas económicas que vêm de fases ainda mais antigas, e por isso há outras classes com uma figura económico-social mais ou menos distinta da do proletariado. Este período de transição é o da ditadura do proletariado.

4. Na sua ditadura, o proletariado, tendo-se tornado a classe dominante, utiliza o poder político de acordo com os seus objetivos de classe, a fim de favorecer o advento, em todos os campos de produção, das condições reais necessárias para passar gradualmente à socialização e organização de toda a produção. Durante este processo longo e trabalhoso, são determinadas várias formas de transição, nas quais os tipos económicos arcaicos são sujeitos a contínuas modificações até se fundirem no tipo geral da grande empresa produtiva, organizada de acordo com os métodos técnicos mais avançados, gerida por toda a comunidade e ao serviço das necessidades humanas universais. Mas é precisamente esta modificação progressiva das estratificações económicas arcaicas que implica a sua permanência substancial por um período de tempo mais ou menos longo.

5. No capitalismo, a agricultura não pode seguir o mesmo ritmo que o desenvolvimento da indústria. Portanto, entre as formas económicas menos desenvolvidas, que não podem ser socializadas imediatamente depois do estabelecimento da ditadura do proletariado, devido à falta das condições técnicas pré-existentes necessárias, como é o caso em Itália, onde para além de uma pequena indústria, as empresas artesanais e mercantes, vemos que a grande maioria das empresas são agrícolas.

6. Portanto, o P.C. que se tornou o partido governamental com o sucesso da ditadura proletária, pode e deve proceder à expropriação imediata e gestão estatal – quer diretamente, quer através de organizações cooperativas – das grandes quintas agrícolas do tipo capitalista, que já são conduzidas com base no trabalho conjunto, especializadas e equipadas com equipamento técnico avançado; mas deve absolutamente evitar a tentativa absurda e anti-marxista de socializar as pequenas quintas, na sua maioria trabalhadas por um família, nas quais os meios de produção (terra, ferramentas, inventário, etc.) não são separados do trabalho.

7. O passo imediato que a ditadura do proletariado pode e deve dar no sentido da introdução do socialismo também nas zonas rurais é a supressão do arrendamento da terra que não é acompanhada de trabalho. Por conseguinte, o poder do proletariado suprime imediatamente todos os direitos e privilégios dos atuais latifundiários que nada trabalham, sejam eles pessoas privadas ou públicas, bancos ou instituições de qualquer tipo, e transfere sem qualquer forma de compensação a posse e livre utilização da terra correspondente para aqueles que a cultivam hoje ou que poderão cultivá-la pessoalmente no futuro, isentando-os de todas as obrigações para com os antigos latifundiários em matéria de rendas, censos, dívidas, etc., e em substituição destas obrigações e do direito à terra. Em vez destas obrigações e do antigo imposto fundiário, os camponeses que assim entraram na posse da terra serão obrigados a entregar uma certa percentagem da sua produção ao governo proletário, a fim de se defenderem das inevitáveis tentativas contra-revolucionárias dos antigos latifundiários despossuídos e de satisfazerem as outras necessidades do estado proletário.

8. As terras expropriadas, tal como as fábricas e instalações industriais, meios de transporte e comunicação, capital bancário e quaisquer outros meios de produção, são assim propriedade comum de todos os trabalhadores de Itália. O poder proletário entrega-as aos conselhos camponeses locais, que as atribuem para o trabalho às várias famílias de camponeses, seguindo as regras gerais estabelecidas pelo poder proletário e visando principalmente assegurar a continuidade e o aumento da produção e eventualmente deixar a terra na posse dos atuais agricultores.

9. Se os conselhos de agricultores locais o considerarem oportuno, e se a sua proposta for aprovada pelos conselhos técnicos e económicos superiores, que nem sempre submeterão a sua aceitação à consideração do que garantirá a melhor e maior produtividade, mesmo as grandes propriedades unidas territorialmente e trabalhadas por assalariados (ou seja, na economia) podem ser sujeitos a esta atribuição individual, onde, no entanto, a exploração da terra é atualmente realizada com técnicas de cultivo retrógradas, e face a isso o parcelamento da terra em pequenas empresas burguesas individuais representaria um progresso técnico e asseguraria um aumento da produtividade. Também seria admissível separar das quintas socializadas as partes que seriam necessárias para completar a atribuição de terras restantes feitas aos camponeses de forma igualitária, desde que este destacamento não prejudique a capacidade produtiva das próprias quintas.

As grandes quintas socializadas, depois de terem satisfeito as suas próprias necessidades, e na medida do tecnicamente possível, devem colocar a sua maquinaria, ferramentas, stocks, gado, pessoal técnico, etc., à disposição dos camponeses locais.
As quintas agrícolas coletivas existentes e outras formas coletividades continuarão a estar sujeitas a necessidades técnicas.


II. O P.C. e os camponeses na fase da luta pela conquista do poder

10. A transferência da propriedade útil da terra para os camponeses nas formas acima indicadas deve ser considerada como a conclusão da revolução burguesa contra os notáveis remanescentes da ordem pré-burguesa e semi-feudal ainda em vigor nas relações agrárias em grandes partes de Itália, especialmente no sul de Itália e nas ilhas; ao mesmo tempo que completa a revolução burguesa, será também o primeiro início da revolução socialista no campo. A revolução dos camponeses, através da abolição da renda da terra separada do trabalho, é apresentada em todo o mundo, e particularmente em Itália, como uma necessidade inescapável, especialmente após o desastre causado pela guerra, como o único meio de conter e mitigar o aumento do custo de vida. De facto, enquanto no regime atual, ou seja a predominância do capitalismo financeiro monopolista, a maior parte da riqueza derivada da terra vai parar, como renda da terra, aos bolsos de algumas dezenas de milhares de senhorios e de gente ausente, e deles ou é dissipada em gastos esbanjadores, ou depositada em bancos e depois absorvida por grandes empresas industriais monopolistas e armamentos do estado imperialista do capitalismo. Quando, por outro lado, a terra passa para a posse livre daqueles que a cultivam pessoalmente, a parte do produto que é agora confiscada ao trabalhador sob a forma da renda seigniorial permaneceria na posse do próprio trabalhador, que a utilizaria para melhorar as suas condições de vida, e naturalmente também para aumentar a produtividade do solo, cujos frutos não teria agora de partilhar com ninguém a não ser com a parte que pertence ao Estado. O facto de que em Itália as condições subjetivas da revolução camponesa existirem num estado mais ou menos consciente é provado pela forma como mostram a sua impaciência com as suas condições de vida, e isto manifesta-se na onda maciça de emigração que seguiu o armistício e favorecida pelos governos burgueses como uma válvula de segurança contra o descontentamento dos camponeses, apesar da necessidade óbvia de trabalhar para a "reconstrução económica". A intensidade deste descontentamento por parte da grande massa de camponeses pobres foi demonstrada pelo grande movimento de ocupação de terras que teve lugar na segunda metade de 1920.

11. A aspiração do camponês italiano de possuir livremente a terra nunca poderá ser satisfeita enquanto a liderança económica e política do país permanecer nas mãos dos magnatas do capitalismo financeiro e industrial. Nunca admitirão, por um instinto de defesa de classe, qualquer prejuízo ao direito "sagrado" dos latifundiários. Além disso, a granda finança bancária-industrial está ligada aos grandes latifundiários por múltiplos laços comerciais, e por isso também está diretamente interessada em apoiá-los contra as reivindicações dos camponeses. Portanto, só a revolução do proletariado, ao derrubar o Estado capitalista, pode remover o obstáculo principal às reivindicações dos camponeses. A liga dos grandes capitalistas e os grandes latifundiários opõe-se, simultaneamente, à emancipação dos trabalhadores do jugo do empresário e à emancipação do camponês do jugo do latifundiário: é natural e inevitável que as duas classes exploradas unam as suas forças.

12. Por outro lado, a revolução proletária tornar-se-ia muito difícil, e certamente mais demorada, se o capitalismo financeiro e industrial na sua resistência pudesse continuar a encontrar o apoio dos latifundiários que não foram afetados pelo seu domínio do campo. Portanto, a aliança intima entre o movimento do proletariado e o do campesinato com o objetivo de arrancar o poder das mãos dos capitalistas e latifundiários, suprimindo as instituições parlamentares, administrativas, judiciais, militares, policiais, etc. em que o governo burguês toma forma, e de o transferir para os representantes diretos e exclusivos dos trabalhadores e camponeses, é em todo o mundo, e particularmente em Itália, uma condição prévia para o triunfo tanto da revolução do proletariado industrial e agrícola como da revolução do campesinato. Os principais esforços do Partido Comunista devem ser dirigidos na direção da implementação e de fazer cumprir esta aliança.

13. O Partido Comunista de Itália deve cumprir esta tarefa pelo meio de, assiduamente e organicamente, propagandizar o seu programa agrário entre as massas rurais, e através da conquista ou criação de organizações de classe de trabalhadores rurais.


III. Como o proletariado agrário está organizado

14. Os trabalhadores assalariados que trabalham nos campos em Itália podem ser divididos em três categorias principais:
     a) Operários e trabalhadores assalariados nas grandes empresas agrícolas ou de desenvolvimento agrário, de tipo capitalista, em condições muito semelhantes às dos proletários da indústria;
     b) trabalhadores assalariados, contratados para o ano agrícola inteiro e para todo o trabalho necessário na terra, ou por um tempo limitado e para trabalho especial, pelo proprietário não trabalhador ou pelo seu representante, em propriedades geridas numa base económica de acordo com sistemas racionais de cultivo individual:
     c) trabalhadores auxiliares assalariados, que durante todo o ano agrícola ou por um tempo limitado, trabalham em terras pertencentes a proprietários trabalhadores, ou em terras cultivadas por parceiros-produtores.

O P.C., ao organizar esta classe, deve ter em conta as diferentes condições das várias categorias, formulando os seus respetivos programas de ação e, se necessário, criando organizações separadas, mas sob a direção de uma única grande organização local, que liderará a luta comum contra a burguesia rural.

15. A categoria a) quase forma um todo com o proletariado industrial, com o qual partilha os objetivos finais comunistas e os objetivos imediatos de melhorar as condições de trabalho, os métodos de luta e o tipo de organização. A ditadura do proletariado retira-o da servidão do capitalismo agrário e transforma-o numa categoria de trabalhadores do estado proletário, que com os trabalhadores industriais constituirá a classe dominante e assumirá a gestão política e económica do estado. O Estado proletário dará a estes trabalhadores condições de trabalho, remuneração, bem-estar e proteção social, para que a sua situação seja superior à do pequeno camponês independente, que será assim mais facilmente induzido a fazer parte desta categoria. No entanto, esta categoria terá de ser mantida na linha da frente da distribuição de terras expropriadas.

16. A ditadura proletária, a fim de aumentar e melhorar a produção agrária, tentará transformar mesmo os grandes latifúndios que são geridas de forma primitiva e retrógrada em fazendas estatais exemplares, geridas com técnicas de ultima tecnologia e de ponta, e às quais o facto da unidade administrativa não confere maior potencial produtivo. Por conseguinte, utiliza todas as formas possíveis de persuasão e excitação para induzir aqueles que estão empregados nestas propriedades a aceitarem a transformação em quintas estatais, ou pelo menos a associarem-se uns aos outros para os gerir numa cooperativa.

Neste último caso, o Estado proletário ajudará a organização cooperativa da produção com todos os meios disponíveis: capital, ferramentas e máquinas melhores, sementes, fertilizantes, drenagem e obras rodoviárias, técnicos especiais, etc.. Quando, no entanto, os assalariados, apesar de tudo, preferirem parcelar as propriedades, excluindo sempre, evidentemente, as realizadas com técnicas aperfeiçoadas, a ditadura do proletariado, alertando que desta forma os camponeses (como grande massa) não conseguirão uma melhoria real das suas condições, não se irá opor à partilha da terra do antigo mestre, e de todo o equipamento relacionado, gado, capital de exploração, etc. No entanto, no interesse da produção, reservar-se-á o direito de controlar e decidir de que forma as terras atribuídas serão utilizadas, revogando, se necessário, a atribuição contra aqueles cujo tratamento das terras represente um retrocesso em relação às condições anteriores. Por outro lado, mesmo para os camponeses que preferirem cultivar individualmente as terras que lhes foram atribuídas, o Estado proletário fará todas as facilidades possíveis para aumentar a sua produtividade.

No presente período de luta pela conquista do poder, as reivindicações da categoria b) coincidem substancialmente com as da categoria anterior, de modo a que possam, se necessário, constituir uma única organização.

17. - A categoria c) não pode ser prometida a cessão do terreno, que permanece com os atuais proprietários-operários. Estará, no entanto, na vanguarda da atribuição das terras expropriadas dos latifundiários, assimilando-se assim em grande parte, em termos do seu programa final e das condições que a ditadura do proletariado lhe irá criar, na categoria b).

Além disso, o governo proletário irá assegurar a facilitação a estipulação de acordos livres entre estes proletários e os seus respetivos empregadores, em todas as formas, de modo a que o trabalho realizado pelos assalariados seja transformado numa participação na gestão e nos lucros da empresa. Hoje, exigências deste tipo não podem ser dirigidas contra o empregador imediato, mas sim contra a burguesia capitalista e agrária que explora tanto o trabalhador-proprietário como os proletários da categoria c). Por conseguinte, quaisquer conflitos entre pequenos proprietários-trabalhadores ou parceiros-proprietários e os seus empregados devem ser resolvidos através de negociações pacíficas entre as respetivas organizações, utilizando a mediação, e em casos em que a reconciliação não é possível, a arbitragem obrigatória pela organização central local. A organização central também se certificará que toda a agitação dos pequenos agricultores para melhorias nos acordos de quintas parcerias rurais, etc., seja acompanhada do reconhecimento, por parte dos rendeiros, parceiros-proprietários, etc., das melhorias correspondentes aos seus empregados; e reciprocamente, que toda a agitação sindical destes últimos seja integrada e fundida com a agitação dos pequenos agricultores para melhorias nos acordos de quinta e de parceria etc., e que a agitação destes últimos seja acompanhada do reconhecimento das melhorias correspondentes aos seus empregados.


IV. Organização dos semi-proletarios

18. Esta categoria inclui os camponeses que cultivam alguns pedaços de terra alugada ou que lhe pertencem, mas os lucros deste trabalho agrícola não são suficientes para cobrir a sua força de trabalho e assegurar a sua subsistência, e assim são forçados a complementar os seus rendimentos trabalhando por salário.

19. Expecto em casos excecionais, dos quais a organização sindical central local é o juiz, não é aconselhável formar organizações separadas desta categoria. Aqueles que a ela pertençam aderirão à organização dos assalariados, ou à dos pequenos proprietários, dependendo se os interesses de um ou de outro prevalecem em cada caso individual.


V. Organização de pequegnos agricultores

20. Esta categoria consiste naqueles camponeses que conseguem viver dos produtos da terra que eles próprios, juntamente com as suas famílias, cultivam, sem terem de complementar os seus rendimentos trabalhando por salários noutro lugar, e sem empregarem regularmente mão-de-obra assalariada.

2I. Para estes pequenos agricultores a ditadura proletária garante a posse pacífica e livre da terra que cultivam atualmente, e além disso a participação na distribuição dos latifúndios confiscados, dentro dos limites constituídos pela possibilidade de cultivar esta terra adicional com a sua própria força de trabalho e a das suas famílias. Além disso, gozarão de outras vantagens consideráveis que o regime burguês nunca lhes poderia conceder; no campo económico, a anulação de todas as formas de dívida, a abolição do imposto fundiário, a livre utilização do inventário vivo e morto das grandes propriedades socializadas, e todo um sistema de facilidades financeiras e de obras públicas, especialmente a utilização em grande escala da eletricidade: no campo político, a transferência do poder público rural dos latifundiários e das autoridades do Estado e os seus cães, para a massa dos camponeses organizados nos Conselhos Camponeses, que excluem a burguesia, e a autonomia real destes Conselhos na administração dos assuntos locais.

22. Enquanto durar o regime burguês, os pequenos agricultores estão divididos em duas categorias, com interesses imediatos distintos: por um lado, aqueles que já são proprietários das terras que cultivam, e por outro, aqueles que simplesmente as alugam, cultivam, partilham, etc. Para esta última, o programa imediato consiste na criação de uma nova sociedade. Para esta última, o programa imediato consiste na melhoria dos acordos agrícolas atuais, arrendamento, partilha rural, etc., e na redução progressiva da parte do produto que agora é devida em dinheiro ou em produto ao proprietário, até que este papel seja completamente suprimido, ou seja, a expropriação do antigo proprietário. A primeira categoria, tendo já livre posse da terra, não tem qualquer interesse direto nas reivindicações acima mencionadas: no entanto, os seus membros também precisam frequentemente de alargar a terra que já possuem e, portanto, também aspiram à ocupação da terra dos latifundiários. Além disso, ambos têm interesses comuns na defesa contra a exploração exercida pela burguesia rural e urbana, sob a forma de encargos estatais, empréstimos pesados, aumentos monopolistas dos preços dos produtos industriais, etc. Como existe entre estas duas categorias uma tal comunidade de interesses imediatos, e os seus interesses são diferenciados mas não conflituosos, ambos podem reunir-se numa única organização, distinta das dos proletários e semi-proletários, mas que é parte, ao seu lado, da mesma organização central do lugar, o núcleo do futuro Conselho de Camponeses.

23. A forma típica de organização dos pequenos proprietários é a cooperativa de produção, de recuperação, de compra e utilização de maquinaria, fertilizantes, etc., de venda de produtos, etc.


VI. Agricultores proprietários médios

24. Esta categoria é composta por proprietários que cultivam a terra diretamente com o seu próprio trabalho pessoal e o das suas famílias, mas que normalmente também empregam mão-de-obra remunerada adicional. Estes proprietários de classe média, interessados em manter a possibilidade de exploração dos proletários e semi-proletários rurais, e em especular sobre o aumento dos produtos agrícolas, e ameaçados pela expropriação da parte da terra que excede a possibilidade do seu trabalho pessoal, não podem ser ideologicamente conquistados pela revolução proletária. Por conseguinte, o movimento sindical revolucionário não tem qualquer interesse em organizá-los; pelo contrário, deve impedir e combater as organizações que esta classe possa ter formado e apoiar plenamente contra elas as lutas dos trabalhadores que eles empregam, e após a conquista do poder, normalmente exclui-los-á dos Conselhos dos Camponeses.

No entanto, não é impossível obter a neutralidade desta categoria, ou pelo menos uma secção deles. Aqueles que a ela pertencem, geralmente, não são capitalistas, e por isso não têm interesse na preservação do regime capitalista, nem em opor-se à socialização da grande indústria. A ditadura do proletariado, como fase transitória, preservará para eles a posse de toda a parte da terra que eles próprios conseguem cultivar, e em certos casos mesmo de uma parte que exceda esta possibilidade, quando tal for exigido pelos interesses da produção, ou quando houver um acordo livre entre eles e os assalariados, por exemplo, com base na transformação dos salários numa parte do produto. Por outro lado, a ditadura do proletariado trará as mesmas vantagens aos agricultores proprietários médios que aos pequenos: abolição do imposto fundiário, das dívidas privadas, censos, hipotecas, rendas enfitêuticas, etc.; uma política geral do Estado proletário orientada para favorecer a produção agrícola de uma forma especial e para ajudar os agricultores a introduzir sistemas agrícolas mais lucráveis, etc. Portanto, é possível e mesmo necessária uma política de compromissos e acordos entre as organizações rurais revolucionárias e estes proprietários-agricultores médios.


VII. A proprietade dos latifundiários

25. Para aqueles proprietários de terras que apenas se apropriam de uma parte dos produtos das terras cultivadas por outros colonos, rendeiros, parceiros-produtores, etc., a ditadura do proletariado não tem nada a oferecer. Trata-se de cavalheiros que não trabalham o quer que seja no campo, e que no entanto ganham com isso rendimentos como parasitas, para além de especuladores capitalistas que alugam vastas extensões de terra e depois as subalugam aos camponeses, serão certamente expropriados na sua totalidade e sem qualquer forma de compensação. Se participarem pessoalmente no cultivo da terra, apenas a parte da terra que eles trabalham com a sua própria mão-de-obra direta e a das suas famílias será isenta de expropriação, e a expropriação será completada ao primeiro sinal de resistência e revolta.

Portanto, esta classe será, no campo, o mais feroz opositor do Partido Comunista, e, no futuro, da ditadura proletária. A luta das organizações revolucionárias dos camponeses será dirigida mais contra esta classe do que contra qualquer outra; o seu primeiro objetivo será o desarmamento dos lordes e dos seus cães (mafiosos, traficantes, fascistas, guardas brancos, em suma, todo o tipo deles); isto é garantido pelo facto de que são eles que têm armas.


VIII. Secçáo agrária do P.C.

26. Para o trabalho de propaganda, agitação e organização entre as massas rurais, bem como para a formação, ligação e atividade dos grupos comunistas nas organizações locais e centrais de trabalhadores da terra, o Congresso resolve que seja constituída uma Secção Agrária no C.E. do Partido, composta por um ou mais membros da C.E. e outros camaradas, escolhidos pela C.E. entre aqueles que têm a maior competência nas questões agrárias e organizacionais.

27. O trabalho da Secção Agrária será realizado em contacto e colaboração contínua com o Comité Sindical do P.C.

28. A Secção Agrária é apenas um órgão executivo que nada mais faz do que implementar, de forma prática e local, as diretivas políticas e organizativas elaboradas pelo Comité Executivo do Partido, com base nas decisões dos Congressos Nacionais e Internacionais. Pode também ser criado num local diferente do do Comité Executivo, de preferência no Sul de Itália.

29. As suas principais funções serão:
     a) organizar, unificar e disciplinar o trabalho de agitação e propaganda entre os camponeses, através da criação de Comités Agrários para cada região agrícola, eleitos pelas organizações locais do Partido e diretamente correspondendo com a Secção; o envio de propagandistas e a distribuição de panfletos e jornais (propõe-se a fundação de dois jornais semanais e quinzenais, um para os proletários rurais e outro para os pequenos camponeses).
     b) Dirigir e unificar o trabalho dos grupos comunistas nas organizações rurais já existentes, virando-o para a conquista destas organizações;
     c) Promover a criação de novas organizações, fazendo-as aderir sistematicamente às organizações de classe existentes (Feder. dos Trabalhadores Rurais e Feder. das Cooperativas), embora ainda sejam lideradas por elementos reformistas e contra-revolucionários, com o objetivo de evitar uma cisão na classe trabalhadora rural e aumentar a influência de elementos revolucionários nas organizações existentes, facilitando assim a sua conquista;
     d) manter a ligação local e nacional mais próxima entre as organizações que seguem as táticas do P.C.;
     e) dar, mediante autorização do C.E. do Partido, as disposições relativas às lutas de carácter local e regional, e possivelmente também para aquelas que envolvem a massa trabalhadora agrícola de todo o país.