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Quem somos e o que queremos [Em português europeu] |
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Nas poucas páginas que se seguem estão condensadas as posições da Esquerda Comunista, organizada enquanto Partido Comunista Internacional. Aquí se enumeran sus órganos de prensa.
O leitor encontrará aqui os elementos fundamentais do marxismo revolucionário, e o proletariado poderá dispor de um partido são e forte, apenas ao se basear neles.
A doutrina e o programa que o partido encarna são o produto da seleção histórica e não fruto de gênios inúteis. A história fundiu-os num bloco de aço durante o curso das sangrentas lutas de classe que, no meio do século XIX, puseram em cena uma nova classe: o proletariado.
O partido é uma corrente de pensamento e um método de ação. Doutrina, programa, táctica e organização constituem o partido. A classe existe enquanto tal somente através do seu partido; sem ele o proletariado constitui-se como classe estatística.
A existência do partido não depende da vontade de grandes chefes, mas da escrupulosa e zelosa conservação e observância dos seus elementos constitutivos; das suas implicações práticas e, ainda, do favorável desenvolvimento das contradições sociais. Em certos períodos históricos se reduz a um pequeno número de tenazes militantes, em outras desenvolve-se, torna-se uma força social determinante para o conflito final com o regime do capital.
Por estas razões, exclui-se que o partido possa regressar como líder das massas combatentes, como havia sucedido no período glorioso de 1917-1926, servindo-se de expedientes tácticos, de sutilezas diplomáticas, de misturas promíscuas com outros grupos políticos esquerdistas, de inovações com significância duvidosa no campo do complexo entrelaçar de relações entre o partido e a classe.
Exclui-se também que o partido reforce a sua estrutura ao recorrer à práticas burocráticas de uma falsa disciplina formal, ou ao defender o restabelecimento de práticas democráticas, há muito expulsas definitivamente não só do nosso seio, mas também do Estado e da sociedade. São meios insignificantes que matam o nosso partido enquanto órgão da classe mesmo que ao se servir deles se visse aumentar o número de inscritos. Esses esforços traem os esforços daqueles que os defendem e os fazem “afundar” na ilusão de que se possa sair do gueto, no qual o verdadeiro partido se encontra constringido, certamente não pela própria vontade, mas devido à pressão quase secular da contra-revolução, vitoriosa em escala mundial, que deforma os deveres e a natureza do próprio partido.
A melhor demonstração da inanidade de tais manobras, melhor do que retirada da crítica de suas idéias, é verificável através da experiência histórica. As relações de força entre as classes sociais não mudaram absolutamente nada, apesar dos trotskistas de tendências várias e dos esquerdistas de mil cores terem defendido por todo o lado uma adequação do partido às situações, ou seja, assumir uma política “realista”, que consiste numa contínua mudança de posições e de caminho.
Se hoje o perímetro do partido se encontra restringido, e sua influência sobre as massas proletárias é quase inexistente, a razão deve ser procurada na luta de classe e nas vicissitudes históricas, devendo-se ter a coragem de aceitar que, ou o marxismo deve ser eliminado e juntamente com ele deverá ser eliminado o partido político, ou que o comunismo marxista deve permanecer inalterável. É desta verificação materialista e histórica, que após ter sido proposta teoricamente, a Esquerda retirou uma fecunda lição: nada deve ser inovado, nada deve ser mudado. Mantenham-nos nos nossos lugares!
Este é um texto do Partido Comunista Internacional, e assim confirma e reafirma as posições da Esquerda Italiana, independente de qualquer mudança de membros que a compõe.
Afirmamos novamente que o regressar ao movimento revolucionário de classe depende do fortalecimento e da radicalização dos conflitos sociais. Estes últimos são consequência da aceleração das contradições do sistema capitalista, com o qual o partido cresce paralelamente baseado em sua intocável doutrina e em seu inalterável programa, e devido ao qual poderá inserir-se em todas as lutas proletárias, de modo a virá-las contra o oportunismo traidor dos falsos partidos operários, contra o oblíquo sindicalismo tricolor, contra o Estado capitalista e contra a frente política burguesa.
A Esquerda sabe que nesta luta está e permanecerá sozinha, não por escolha própria, mas devido à dedução baseada nas férteis derrotas do proletariado. Nestas derrotas tiveram um papel proeminente contra-revolucionário as posições e os grupos que, que evocando o proletariado e até mesmo o marxismo e a revolução, possuíam os mesmos interesses de camadas da pequena burguesia e da aristocracia operária, primeiro obstruíram, depois dividiram e, por último, abandonaram a frente proletária ao inimigo.
Há muito que prestamos contas com as atuais lideranças dos sindicalistas, anarquistas e “extremistas” e a história também, ao esmagar impiedosamente as suas doutrinas e as suas ações.
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Dedicamos este breve texto sobretudo à juventude proletária, para que, com a coragem, a abnegação e o ímpeto que lhe são próprias, vire para sempre as costas às ilusórias tentações da sociedade de hoje, aos falsos mitos de democracia e solidariedade nacional, de reformismo e gradualismo e abrace um programa de luta, de combate, com a frente comunista revolucionária, anônima e impessoal.
Porque é dos jovens o dever de levar à vitória o comunismo.
O Partido Comunista Internacional é constituído com base nos seguintes princípios estabelecidos em Livorno, em 1921, na fundação do Partido Comunista da Itália (Secção da Internacional Comunista).
1. No atual regime social capitalista desenvolve-se um sempre crescente contraste entre as forças produtivas e as relações de produção que dão lugar à antítese de interesses e à luta de classe entre o proletariado e a burguesia dominante.
2. As relações de produção de hoje são protegidas pelo poder do Estado burguês que, qualquer que seja a forma do sistema representativo e o uso da democracia eletiva, constitui o órgão de defesa dos interesses da classe capitalista.
3. O proletariado não pode quebrar nem modificar o sistema de relações capitalistas de produção, do qual deriva a sua exploração, sem tomar violentamente o poder da burguesia.
4. O órgão indispensável da luta revolucionária do proletariado é o partido de classe. O partido comunista, que reúne em si a parte mais avançada e decidida do proletariado, unifica os esforços das massas trabalhadoras, afastando-as das lutas que visam interesses de grupos e resultados contingentes à luta geral a favor da emancipação revolucionária do proletariado. O partido tem o dever de divulgar às massas a teoria revolucionária, de organizar os meios materiais de ação e de dirigir a classe trabalhadora para a luta, garantindo a continuidade histórica e a unidade internacional do movimento.
5. Depois de derrubar o poder capitalista o proletariado não poderá organizar-se como classe dominante senão com a destruição do velho apoio estatal e a instauração de sua própria ditadura, ou seja, retirando quaisquer direitos e funções políticas à classe burguesa e aos seus indivíduos enquanto estes sobreviverem, fundando os órgãos do novo regime somente sobre a classe produtiva. O partido comunista representa, organiza e dirige unitariamente a ditadura proletária e a sua característica programática consiste nesta fundamental realização.
6. Somente a força do Estado proletário poderá sistematicamente realizar todas as medidas sucessivas de intervenção nas relações da economia social, com as quais se efetuará a substituição do sistema capitalista pela gestão colectiva da produção e da distribuição.
7. Para efeitos de transformação econômica e consequentes transformações de todas as atividades da vida social, eliminar-se-á a necessidade do Estado político. A sua engrenagem reduzir-se-á progressivamente a uma racional administração das atividades humanas.
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A posição do partido frente às situações do mundo capitalista e do movimento operário depois da Segunda Guerra Mundial funda-se nos seguintes pontos:
8. Durante a primeira metade do século vinte o sistema social capitalista desenvolveu-se no campo econômico com a introdução de sindicatos patronais, com o objetivo de monopolizar, tentar controlar e dirigir a produção e as trocas segundo planos centrais, até à gestão estatal completa de sectores da produção; No campo político temos o aumento da potência policial e militar do Estado e o totalitarismo do governo. Não se trata de novos tipos de organização social com carácter de transição entre o capitalismo e o socialismo, nem de um regresso a regimes políticos pré-burgueses; trata-se, sim, de formas precisas e ainda mais diretas de exclusiva gestão do poder e do Estado por parte das forças mais desenvolvidas do capital.
Este processo exclui as interpretações pacíficas evolucionistas e progressivas do devir do regime burguês e confirma a previsão da concentração e da disposição antagonista das forças de classe. Para que as energias revolucionárias do proletariado se possam intensificar e concentrar, o proletariado deve rejeitar como sua reivindicação e meio de agitação o regresso ilusório ao liberalismo democrático e o pedido de garantias legalistas e deve eliminar historicamente o método das alianças com fins transitórios, seja com os partidos burgueses e os da classe média, seja com os partidos pseudo-operários de programas reformistas.
9. As guerras imperialistas mundiais demonstram que a crise da desagregação do capitalismo é inevitável para a abertura decisiva do período em que a sua expansão não mais exalta o incremento das forças produtivas, mas condiciona a acumulação em direção a uma sucessiva e maior destruição. Estas guerras causaram crises profundas e recorrentes na organização mundial da classe trabalhadora. Por este motivo, as classes dominantes puderam impor sobre os trabalhadores a solidariedade nacional e militar, o colocando em um fronte ou outro da guerra. A única alternativa histórica que pode opor-se a esta situação é o fato que a luta de classe se reacenda até à guerra civil das classes trabalhadoras para derrubar o poder de todos os Estados burgueses e das coligações mundiais, através da reconstituição do partido comunista internacional como força autônoma de todos os poderes políticos e militares organizados.
10. O aparato do Estado proletário, enquanto um meio e uma arma de luta num período histórico de transição, não consegue a sua força organizativa de cânones constitucionais nem de esquemas representativos. A máxima explicação histórica da sua organização foi, até hoje, a dos Conselhos dos trabalhadores que apareceu na Revolução russa de Outubro de 1917, durante o período da organização armada da classe operária sob a única chefia do partido bolchevique, da conquista totalitária do poder, da dispersão da assembleia constituinte, da luta para repelir os ataques externos dos governos burgueses e para esmagar, no interior do país, a revolta das classes derrotadas, as classes médias e da pequena burguesia e os partidos do oportunismo, inevitáveis aliados da contra-revolução nos momentos decisivos.
11. A conquista completa do socialismo é inconcebível de se alcançar dentro das fronteiras de um país apenas e a transformação socialista não pode ser efetiva sem derrotas e obstáculos momentâneos. A defesa do regime proletário contra o perigo constante da degeneração pode ser garantida apenas por uma contínua coordenação da política do Estado operário com a luta unitária internacional do proletariado de cada país contra a própria burguesia e o seu aparelho estatal e militar; esta é uma luta incessante em qualquer situação, paz ou guerra. A coordenação necessária só pode ser garantida mediante o controle político e programático do partido comunista sobre os aparelhos do Estado em que a classe operária obteve o poder.
Baseando-se neste programa disposto acima, o Partido Comunista Internacional reivindica os princípios doutrinais do marxismo na sua totalidade: o materialismo dialéctico enquanto sistema de concepção do mundo e da história humana; as doutrinas econômicas fundamentais contidas no Capital de Marx enquanto método de interpretação da economia capitalista; as formulações programáticas do Manifesto dos Comunistas enquanto percurso histórico e político da emancipação da classe operária mundial. Reivindica também o sistema total de princípios e métodos de que a vitoriosa experiência da revolução russa, a obra teórica e prática de Lenin e do partido Bolchevique nos anos cruciais da tomada de poder e da guerra civil, as clássicas teses do II Congresso da Internacional Comunista. Representando a afirmação, restauração e o consequente desenvolvimento dos princípios já mencionados, que hoje se mostram especialmente claras frente às lições da trágica onda revisionista iniciada em 1926-27, sob o nome de “socialismo num só país”.
Esta onda, que somente por convenção se liga ao nome da pessoa de Stalin, teve origem na pressão de forças sociais objetivas proeminentes na Rússia, logo após a falha da extensão a todo o mundo do incêndio revolucionário de Outubro de 1917 – pressão que não se pensou opor a tempo com uma barreira programática e táctica que, mesmo que não conseguisse impedir a derrota, teria tornado menos difícil e tormentosa o renascimento do movimento comunista internacional.
Esta onda teve efeitos muito mais letais do que o vírus oportunista que afligiu a breve existência da Primeira Internacional (desvios anarquistas), do vírus que empurrou a Segunda para o abismo da adesão à union sacrée e, por conseguinte, à guerra imperialista do ano de 1914 (gradualismo, parlamentarismo, democratismo). Assim, hoje, a mais de cinquenta anos do Segundo conflito mundial, a situação do movimento operário aparece mil vezes mais crítica do que nos dias do desmoronamento vertiginoso da II Internacional ou no romper da Primeira Guerra Mundial.
A Terceira Internacional nasceu em 1919 com um programa que, restabelecendo os fundamentos da doutrina marxista, rompia definitivamente com as ilusões democráticas, gradualistas, parlamentares e pacifistas da Segunda (naufragadas, aliás, durante a guerra pelo mais ignóbil chauvinismo e belicismo). A Terceira Internacional foi uma imensa contribuição histórica de Lenin, de Trotski e dos velhos bolcheviques, mas ela nasce sobre um bases instáveis, aparente no método acelerado de constituição dos partidos comunistas, principalmente na Europa ocidental, e na táctica demasiada elástica adotada para “conquistar as massas”.
Este método e esta táctica, para os artificies do Outubro Vermelho, não significavam e nem devem ser entendidas como o abandono dos princípios-base da conquista violenta do poder, da destruição do aparelho estatal burguês parlamentar e democrático e da instauração da ditadura proletária dirigida pelo Partido. A sua aplicação poderia não fazer surtir efeitos desastrosos se a revolução, como se esperava, tivesse a revolução rapidamente se espalhado em todo o mundo. Mas, como avisou a Esquerda desde o II Congresso de 1920, arriscavam ter consequências muito negativas se a onda revolucionária vacilasse, os partidos muitas vezes reunidos à pressa, não estavam suficientemente imunizados contra a possibilidade de recaídas social-democráticas se a onda tornasse a refluir, como infelizmente refluiu, trazendo a tona não só os homens, mas também as doenças gangrenadas de um passado muito recente.
A Esquerda, entre 1920 e 1926, invocou a definição de uma plataforma programática e tática única para todas as seções da Internacional; e alertou contra os perigos da aplicação do “parlamentarismo revolucionário” no Ocidente empestado pela democracia há mais de um século, mas sobretudo opôs-se primeiro à táctica da “frente única política”, mais tarde ao “governo operário” (e operário-camponês) como uma formula equivocada a ser colocada no lugar da inequívoca “ditadura proletária”. Condenou o método de adesão direta à Internacional de organizações independentes do partido comunista local e o método de aceitação de partidos “simpatizantes” e rejeitou o sistema de infiltração em partidos pseudo-operários ou mesmo burgueses (como o Kuomintang), e rejeitou constituir um “bloco” – mesmo temporário – com partidos supostamente afins ou contingentemente alinhados em posições aparentemente “semelhantes”.
O critério sobre o qual a Esquerda, nesse tempo, se inspirou foi e permaneceu o seguinte: o fortalecer dos partidos comunistas depende não de manobras tácticas ou da ostentação de voluntarismo subjetivo, mas de um percurso revolucionário objetivo, o qual não possui nenhuma razão para obedecer aos cânones de um projeto linear e contínuo. A tomada do poder pode estar longe ou perto, e nos dois casos, mas sobretudo no primeiro, se preparar (e preparar uma camada mais ou menos vasta de proletários) significa renunciar toda ação susceptível de fazer a organização comunista recair num oportunismo análogo ao da II Internacional, ou seja, numa ruptura da inseparável ligação entre meios e fins, táctica e princípios, objetivos imediatos e objetivos finais, qual resultado não pode ser senão o regresso ao eleitoralismo e ao democratismo na política, e ao reformismo no campo social.
A partir de 1926, o contraste transferiu-se diretamente para o plano político e terminou na ruptura entre a Internacional e a Esquerda Comunista na Itália. As duas questões fundamentais eram o “socialismo num só país” e, pouco tempo depois, o “antifascismo”. O “socialismo num só país” é uma dupla negação do leninismo, porque contrabandeia como se fosse socialismo o que Lenin chamava “desenvolvimento capitalista à europeia na Rússia pequena-burguesa e semi-medieval”, e porque separa o destino da revolução russa do da revolução proletária mundial. É a doutrina da contra-revolução: no seu interior, ela justificou a repressão contra o velho grupo marxista e internacionalista, começando por Trotski; fora dos confins da URSS, favoreceu o esmagamento das correntes de esquerda por parte das fracções de centro, muitas vezes derivantes sobreviventes da socialdemocracia, “rendidos em toda a linha, frente à burguesia” (Trotski).
A principal manifestação deste abandono dos pontos cardeais programáticos da luta comunista mundial foi a substituição da palavra de ordem da tomada de poder revolucionária por a da defesa da democracia contra o fascismo, como se as duas formas de governo não respondessem ao comum objetivo da conservação do regime capitalista frente ao perigo de uma nova onda revolucionária do proletariado, alternando-se no leme do Estado segundo as imperiosas exigências da dinâmica da luta entre as classes. O fenômeno manifestou-se não só na III Internacional depois da queda do império alemão, seguida da vitória de Hitler em 1933, mas também na mesma oposição “trotskista” que retomou a palavra de ordem da “defesa da democracia contra o fascismo” mesmo tendo-a apresentado como “fase” ou “etapa” a percorrer antes de poder apresentar as reivindicações máximas do proletariado revolucionário. Em ambos os casos levou à destruição da classe operária como força política diversa com objetivos opostos aos de qualquer outro estado social, à mobilização dos proletários dos vários países para a defesa, primeiro, das instituições democráticas, depois, da “pátria”, ao renascimento e à exasperação dos ódios chauvinistas; por fim, à degradação, também formal, da Internacional Comunista e à temporária aniquilação de qualquer desejo de a reconstrução.
Emparelhada a classe operária à “carroça” da guerra imperialista de 1939-1945, as frágeis forças do comunismo internacional e internacionalista, se e onde conseguiram sobreviver, não estiveram em condições de influir de modo algum sobre a situação: o grito de “transformação da guerra imperialista em guerra civil” – feito em 1914, mas que antecipava a revolução russa de 1917 – caiu no vazio e no desprezo. O pós-guerra não só não manteve as “ingênuas” esperanças de uma expansão do comunismo revolucionário na ponta das baionetas russas, como também viu o triunfo de um neo-ministerialismo ainda pior do que os das direitas da III Internacional, porque foi exercido durante o período mais difícil da reconstrução capitalista a favor da restauração da autoridade do Estado (desarme dos proletários nas formações partisans), da salvação da economia nacional (empréstimos para a reconstrução, aceitação da austeridade em nome dos “interesses superiores” da nação, etc.) e, mais tarde, nas “democracias populares”, a favor do restabelecimento de uma ordem mascarada de “soviética” (Berlim, Poznan, Budapeste).
Acabado o período de colaboração aberta ao leme do Estado, os partidos “comunistas” filiados ao Kremlin viram-se postos à margem de uma “oposição” puramente parlamentar pelos aliados de guerra e de “paz”, num mundo sempre mais enfeitado de aço, mais policial e fascista; mas, longes de alcançar a via indicada por Lenin (coisa que, mesmo se quisessem, não teriam conseguido fazer) precipitaram sempre mais no abismo de uma total revisão da doutrina marxista, até chegar a não prever e a não propugnar mais o fim nem do capitalismo (exaltado, pelo contrário, na forma do comércio internacional), nem do parlamentarismo burguês, que tentavam defender contra os ataques da burguesia, esquecida do seu passado “glorioso”. Cessaram, por fim – muito antes da “abertura ao mercado” dos países do Leste – abandonaram o desenvolvimento daquela suposta luta entre o “campo socialista” e o “campo capitalista”, na qual o stalinismo tinha acabado por reduzir à de classe, já que, à escala internacional, a palavra de ordem tornou-se: “Coexistência e competição pacífica!”.
Hoje, aqueles partidos mudaram de nome, não podendo nem sequer tolerar a definição de “comunistas”, que há muito lhes pesava.
A “coexistência” e o conflito econômico não podiam senão levar, com o tempo, também à aniquilação do stalinismo. Para o nosso partido a abjuração do stalinismo nos países do bloco de Este não foi uma surpresa, o nosso partido já o havia previsto como uma inevitável e definitiva superação no plano econômico da toda a separação do mercado mundial e da autarquia necessária aos países subdesenvolvidos para o seu primeiro desenvolvimento da indústria capitalista nacional, dando-lhe a possibilidade de competir com a indústria das velhas potências capitalistas.
Agora a Russia não faz nenhuma encenação quanto ao seu caráter “socialista” ela tornou-se um país plenamente capitalista, com produtores proletarizados e com a total interiorização de todo o lixo econômico, político, social e moral de uma verdadeira e completa “democracia”. A traição stalinista do comunismo e a sua colaboração com o capitalismo podre do atlântico e ocidental, reduziu à cinzas frias o fulgor da revolução comunista de 1917 que fez tremar o mundo, mas que arrancou, em contrapartida, a Rússia de sua inércia semi-feudal, alavancando sua acumulação primitiva capitalista com o ferro e com o fogo e com todos os horrores que a acompanham. O prevalecer desta situação em todos os cantos do planeta não é prova da derrota do comunismo, mas, pelo contrário, é a melhor premissa para a sua vitória futura. A grande Revolução de Outubro, proletária, internacionalista e comunista, continua, desde então, a iluminar o caminho para uma nova, mais potente, e vencedora, Revolução.
É do fundo deste precipício que, antecipando a reconquista proletária, parte o grito: “Proletários de todo o mundo, uni-vos!” e “Ditadura do proletariado!”. É o nosso grito.
Em termos de doutrina geral da evolução histórica e social, a degeneração política completa do velho movimento comunista levou à rejeição da visão “catastrófica” de Marx: nem os contrastes de classe, nem os conflitos entre os Estados jamais desaguarão, dizia-se, numa luta violenta ou em conflitos armados. Fundamentalmente, isto quer dizer que a perspectiva era a de uma paz internacional, batizada de coexistência pacífica e a de uma paz social garantida pela palavra de ordem conservadora e reacionária de uma “nova democracia” apoiada na “planificação democrática”, nas “reformas de estrutura” e na “luta contra os monopólios”. Com efeito, o “comunismo” stalinista, e ainda mais o pós-stalinista, não era senão uma apologia do Progresso, na medida em que exaltava o aumento da produção e da produtividade; não era senão uma apologia do Capitalismo, na medida em que exaltava o incremento dos comércios.
Hoje – quando a rigidez da “coexistência pacífica” cedeu o lugar a uma situação internacional fluida que procura novas disposições em vista do próximo conflito mundial – os partidos oportunistas pseudo-operários não se conseguem nem sequer formalmente se distinguir dos declaradamente de “direita”.
Frente a traição de cada princípio de classe, as posições marxistas permanecem as mesmas: sob o capitalismo o aumento da produção e da produtividade significa a exploração crescente do trabalho por parte do capital, o aumento desmesurado da parte não paga do trabalho, da mais-valia. O consumo e os “fundos de reserva” impulsionados pela classe, seja de forma social ou individual (seguro contra as doenças e velhice, legislação familiar, etc.), podem crescer, mas igualmente cresce a submissão do produtor ao capital e a insegurança da sua condição cada vez mais ligada aos altos e baixos da economia de mercado. O antagonismo de classe não diminuiu, de modo algum; pelo contrário, subiu ao máximo.
A extensão do comércio significa a extensão do domínio dos países desenvolvidos sobre os países subdesenvolvidos e o progressivo azedar da natural concorrência entre os países desenvolvidos. Ao ligar os diversos povos, os diversos continentes nas malhas de uma economia sempre mais mundial – o que é uma real, se bem que involuntária, conquista do capitalismo – a extensão do comércio apresenta dialeticamente um aspecto “negativo” que todos os seus apologistas fingem ignorar: a preparação de crises comerciais, isto é, financeiras e industriais, cuja saída, agora e antes, não pode ser senão a guerra imperialista. De resto, uma parte crescente das forças produtivas é, nos dias de hoje, é certamente desperdiçada não só na produção de bens e serviços pelo comércio “honesto” e de “interesse recíproco” – querida aos oportunistas do ocidente e oriente – e que certamente abençoa toda a humanidade, mas também na produção de armas destrutivas, cuja função é mais econômica (acumulação para absorver a superprodução) do que militar.
O capitalismo é a reprodução sem fim do capital; o objetivo da produção capitalista é o próprio capital. O aumento da produção de mercadorias para além de qualquer limite natural e em grande velocidade, não gera um maior bem-estar à espécie humana, pelo contrário, gera uma série de catastróficas crises de superprodução que desestabilizam a vida social em todo o planeta. Destas crises – negadas por décadas por todos os teóricos burgueses e consideradas, por sua vez, inevitáveis pelo autêntico marxismo – a classe operária é a primeira vítima, trazendo consigo o peso do desemprego, a redução dos salários e a intensificação das cargas de trabalho.
Para o capitalismo, a guerra é a necessária consequência da sua periódica crise de sobreprodução. A guerra capitalista é, por consequência, inevitável. Só as desmesuradas destruições provocadas pelas guerras mundiais modernas permitem ao capitalismo poder retomar o seu ciclo infernal de reconstrução-acumulação. As contemporâneas guerras mundiais imperialistas – se bem que sempre bem escondidas por trás de fantasias “humanitárias”, “democráticas”, “pacifistas”, “defensivas” – são, na realidade, necessárias aos vários capitalismos para que estes possam dividir entre si os exaustos mercados e os continentes. São guerras para a conservação do capitalismo, seja no plano econômico, seja porque providenciam, durante a crise, a eliminação da parte de força-trabalho, que excede as reduzidas capacidades de uso produtivo. São hediondas matanças de escravos que o capital não está momentaneamente capacitado para manter. Ou guerra ou revolução, não há outra via.
A atitude comunista revolucionária para com a guerra denuncia a trágica ilusão de querer unir o capitalismo e a paz, e afirma que só a destruição do poder burguês e a destruição das profundas relações fundadas sobre o capital poderão libertar a humanidade da certeza de sua condenação. Na linha de Marx e de Lenin, proclama a táctica do antimilitarismo de classe, da fraternização nas frentes, do derrotismo revolucionário na frente e nas retaguardas, de modo que possam inverter a guerra entre os Estados em uma guerra entre classes.
É uma contradição material que invalida todas as posições dos movimentos pacifistas, legalistas e interclassistas; condenam a guerra mas apenas nos limites do presente regime, o comunismo prevê que, por causa de seu cunho burguês, quando tiverem de ser obrigados a escolher entre a Guerra e a Revolução, optarão necessariamente pela primeira. Junto de Lenin, consideramos estes como propagadores de confusão, em detrimento da orientação da batalha do proletariado e como instrumentos auxiliares do militarismo, conduzindo os proletários à guerra. São os pacifistas que, acusando o “agressor” do momento de cometer horrores sobre as populações, que as guerras imperialistas sempre e inevitavelmente causam, vêm pedir aos Estados burgueses que as “parem usando todo e qualquer meio” e aos proletários que se massacrem reciprocamente, em prol do falso ideal de “paz”, “democracia”, “civilização”, etc.
Frente aos argumentos mais classicamente reformistas do pós-stalinismo, as posições do marxismo revolucionário permanecem os que eram no tempo da social-democracia: o capitalismo moderno não é caracterizado pela “ausência de um plano” (Engels já disse!), a “planificação” sozinha, seja qual ela for, não basta para caracterizar o socialismo. Nem sequer o desaparecimento (mais ou menos real dependendo do caso) da figura social do capitalista – que supostamente caracterizava a sociedade russa do passado – bastaria para provar a abolição do próprio capitalismo (Marx afirma!), o capitalismo não é outra coisa senão a redução do trabalhador moderno a uma condição de assalariado, onde esta condição subsistir, continuará a subsistir a outra.
A apologia do capitalismo e o reformismo de aspecto social-democrático, cuja fusão era característica do “comunismo” russo ou chinês, até mesmo pior do que o reformismo clássico, alia-se a um derrotismo que, enquanto forma de um reflexo psicológico e ideológico da desagregação da força revolucionária do proletariado, esteriliza até mesmo a revolta que esta apologia e este reformismo suscitam em certos ambientes operários. Ele consiste, antes de tudo, em negar à classe operária qualquer possibilidade de superar a concorrência exasperada que hoje a divide, de revoltar-se contra o despotismo das necessidades criadas pela prosperidade capitalista, de fugir à estupidez gerada pela organização burguesa do bem-estar, dos entretimentos, da “cultura”, para poder constituir-se como partido revolucionário; em segundo lugar, consiste em admitir, implícita ou explicitamente, que o progresso nos armamentos tem transformado num monopólio sempre mais indestrutível a posse do potencial militar da sociedade por parte da classe dominante. Todas estas posições equivalem à abdicação de toda a esperança revolucionária frente à omnipotência atual, mas para nós, historicamente transitória do capital.
A encontramos sempre em cada época de reação política e social (respeito supersticioso da potência militar do inimigo, já combatido por Engels no tempo dos canhões e espingardas “convencionais”; desprezo ou desdém filisteus pela “obtusidade”, “ignorância” e “falta de idealismo” dos operários, já combatido por Lenin e por todos os militantes revolucionários), mas cada uma delas cria para si razões próprias e imperiosas para poder acreditar naquelas posições (a bomba atômica e a bomba de hidrógeno ou, como nas elucubrações marcusianas e semelhantes, o poder irremediavelmente corruptor da “sociedade de consumo”!).
O instrumento central desta intimidação moral são os potentes meios de comunicação que repetem obsessivamente que a sociedade presente é o “menor mal” possível.
Até mesmo nisto, as posições marxistas permanecem as de sempre: o capitalismo divide, mas ao mesmo tempo concentra e organiza o proletariado; e no fim a concentração leva a vantagem sobre a divisão. O capitalismo corrompe e enfraquece mas, sem querer, educa revolucionariamente o proletariado; e no fim tal educação leva a vantagem sobre a corrupção. Na realidade, todos os produtores sofisticados das “indústrias do prazer” são impotentes em mitigar o crescente mal-estar da vida social (seja ela urbana ou rural), tal como os tranquilizantes da medicina moderna são impotentes para restituir ao homem da sociedade capitalista a harmonia nas relações com si próprio e com os outros, que a “vida moderna” – quer dizer, capitalista – destrói. Mais ainda do que neste tipo de corrupção a força do capital reside, hoje como ontem, no esmagamento do produtor com o comprimento do dia, da semana, do ano e da vida de trabalho. Mas o capitalismo deve, forçosa e naturalmente, limitar historicamente esta tarefa; a faz de modo lento, mesquinho, com contínuos passos atrás, mas não pode deixar de o fazer, os efeitos disso, como previram Marx e Engels, serão necessariamente revolucionários, ao pensar que, doutro lado, o capitalismo é igualmente obrigado a instruir (ao mesmo tempo que os embrutece) os que se tornarão os seus “coveiros”.
Consequentemente, existem duas perspectivas principais para o futuro, a da explosão de uma crise (do tipo da de 1929) que reduza à condição de proletário o “operário emburguesado” de hoje – para nós o mais provável – ou a de uma longa fase histórica de expansão e “prosperidade”, mas é apenas assumindo abertamente o derrotismo (como vem fazendo, cada um de sua maneira, os maoistas, os castristas, guevaristas e etc.) que se pode entender a desorganização do proletariado como uma condenação histórica definitiva, uma impotência “sociologicamente determinada” da reconstituição do Partido e de uma Internacional classista, e assim, aceitar a necessidade de que outras camadas sociais ou categorias sociológicas (agricultores, estudantes e outros) tomem o lugar dianteiro na revolução social.
Mais especificamente, é absurdo crer que, com a superior potência social que o próprio desenvolvimento do capitalismo confere à classe assalariada ela tenha se tornado impotente para realizar a primeira tarefa de cada revolução social da história: o desarme do inimigo da classe, a apropriação totalitária do seu potencial militar.
No plano político e social, a vitória final do democratismo sobre a doutrina revolucionária do proletariado no velho movimento comunista chegou a apresentar a “resistência ao totalitarismo” como o objetivo do proletariado e de todas as camadas sociais oprimidas pelo capital.
Esta orientação, qual primeira manifestação histórica foi o antifascismo de pré-guerra e de guerra, não poupou nenhum dos partidos ligados a Moscou (não importa se estes estavam desligados do seu controle, como o partido chinês), caindo na negação do partido único – forma de origem indubitavelmente comunista e leninista – como necessário guia da revolução e da ditadura proletária. Enquanto que nas “democracias populares” do chamado “campo socialista” o poder estava nas mãos de “frentes” populares ou nacionais, ou seja, de partidos ou “ligas” que explicitamente encarnavam um bloco de mais de uma classe, os partidos “comunistas” operantes no “campo burguês” tinham feito uma solene abjuração à doutrina da violência revolucionária de classe como única via para o poder, e à ditadura exercida pela classe através de um só partido comunista como única via, ao mesmo tempo que prometiam aos muito elogiados interlocutores socialistas, católicos e outros, um “socialismo” gerido em conjunto por vários partidos que representariam o “povo”. Sugestão aceita rapidamente por todos os inimigos da revolução proletária, que no “comunismo” de inspiração stalinista rejeitavam tudo que recordasse o grande Outubro vermelho.
Mas esta orientação não era somente derrotista como também ilusória. O proletariado não reivindica para si nenhuma liberdade no quadro do regime despótico do capital e, consequentemente, não faz sua a bandeira da democracia nem “formal”, nem “real”; por isso, reivindica como parte integral do seu programa a supressão de todas as liberdades para os grupos sociais ligados ao capital no quadro do regime despótico que, tomado o poder, imporá à classe vencida. Se a burguesia mascara a própria ditadura por detrás da dissimulação democrática – segundo a qual sobre a arena política colidem não classes antagonistas, mas indivíduos livres e iguais entre si, “dialogantes”, onde o único embate seria de opiniões, em vez de forças físicas e sociais divididas por irremediáveis contrastes – os comunistas que, desde o tempo do Manifesto, “não têm nada a esconder”, proclamam abertamente que a conquista revolucionária do poder, um necessário prelúdio à regeneração social, significa o domínio totalitário da ex-classe oprimida, incarnada pelo seu partido, sobre a ex-classe dominante.
O antitotalitarismo é uma reivindicação das classes que se movem na mesma base social que a classe capitalista (disposição privada dos meios de produção e dos produtos), mas que são irremediavelmente esmagadas por ela; é a ideologia – comum aos coloridos movimentos de “intelectuais”, “estudantes” que periodicamente infestam a cena política – da pequena e da média burguesia urbana e camponesa ligada aos mitos da pequena produção, da soberania do indivíduo e da “democracia direta” que os sabe serem condenados pela história, mas que sempre tentam desesperadamente salvar. O antitotalitarismo é uma mistura burguesa e anti-histórica e por estes dois motivos, é também anti-proletária. A ruína da pequena burguesia sob os golpes do grande capital é historicamente inevitável e socialmente constitui – à maneira capitalista, brutal e lenta ao mesmo tempo – um passo em direção à revolução socialista ao mesmo tempo que torna operante a verdadeira e única contribuição do capitalismo: a centralização da produção, a socialização da atividade produtiva.
O proletariado, que no regresso (mesmo que tal fosse possível) às formas de produção menos concentradas, não pode evitar um afastamento do seu objetivo histórico, próprio de uma produção e de uma disposição dos produtos completamente sociais, não reconhece como sua tarefa nem a defesa da pequena burguesia contra a grande (uns e outros igualmente inimigos do socialismo) nem a adoção da política do pluralismo e do “policentrismo” no plano econômico e social.
Tal como era, e é, reacionária a palavra de ordem da “luta contra os monopólios” em defesa da pequena produção, são também reacionários todos os movimentos que – seja por reflexo das ideologias da pequena burguesia, seja por uma equivocada reação ao curso degenerativo da revolução russa (interpretado como efeito, não da falta de extensão internacional da revolução proletária e do abandono do internacionalismo comunista, mas da instauração desde o início de uma ditadura totalitária, logo antidemocrática) – vêem o processo revolucionário como uma gradual conquista de ilhas de “poder” periférico por parte de organismos proletários indiferenciados organizados no local de trabalho, que possibilitariam uma impossível “democracia direta” (teoria gramsciana e ordem-novista dos conselhos de fábrica, devaneios atuais de vários “poderes” operários, entre outros.). Ignoram o problema central da conquista do poder político, da destruição do Estado capitalista, e, consequentemente, do partido como órgão centralizador da classe. Outros apresentavam como “socialismo” um sistema baseado numa rede de empresas “autogeridas”, cada uma elaborando o seu plano através de órgãos de “decisão de base” (teoria Iugoslava da autogestão), destruindo assim da raiz a possibilidade da “produção social moderada pela previsão social”, a qual Marx indicava ser “a política econômica da classe trabalhadora” e que seria realizável apenas ao se superar a autonomia das células produtivas da economia capitalista e o “domínio cego” do mercado onde encontram o único, caótico e imprevisível, elemento de conexão entre si.
Antes ou depois da tomada de poder, na política ou na economia, o proletariado revolucionário não faz, nem pode fazer nenhuma concessão ao antitotalitarismo, uma outra versão do anti-autoritarismo idealista e utópico que Marx e Engels tinham denunciado numa longa polêmica contra os anarquistas, e que Lenin, no Estado e Revolução, tinha demonstrado que convergia ao reformismo gradualista e democrático. Em relação aos pequenos produtores, o proletariado socialista não usará a ferocidade de que o capitalismo mostrou em toda a sua história, mas, em relação à pequena produção e aos seus reflexos políticos, ideológicos e religiosos, a sua ação será infinitamente mais decisiva, mais rápida, e enfim, totalitária. À inteira espécie humana a ditadura proletária poupará uma quantidade infinita de violências e de miséria que o capitalismo constitui como seu quotidiano, mas poderá fazê-lo só se usar a força, a intimidação e, se necessário, a mais resoluta repressão contra qualquer grupo social, pequeno ou grande, que a impeça de levar a cabo a sua missão histórica.
Concluindo: quem associar a noção de socialismo a uma forma qualquer de liberalismo, democratismo, ‘empresarismo’, ‘localismo’, pluripartidarismo ou, pior ainda, anti-partidarismo, se coloca fora da história, fora da via que leva à reconstituição do Partido e de uma Internacional totalitariamente comunistas.
A partir de 1848, não por acaso desde o aparecimento daquilo que se intitula, sem especificações nacionais, o Manifesto do Partido Comunista, o comunismo e a luta pela transformação revolucionária da sociedade são por definição internacional e internacionalistas: “Os operários não têm pátria”; “A ação unida, pelo menos nos países civilizados, é uma das primeiras condições para a emancipação do proletariado”.
No ato da sua constituição em 1864, a Associação Internacional dos Trabalhadores inscreveu nos seus estatutos gerais o reconhecimento que “todos os esforços para alcançar o grande final da emancipação econômica da classe operária faliram por falta de solidariedade entre as múltiplas categorias de operários em cada país e pela ausência de uma união fraternal entre as classes operárias dos diferentes países” e proclamou com força “que a emancipação dos operários não é um problema local nem nacional, mas um problema social que abrange todos os países em que existe a sociedade moderna e em que a solução depende da colaboração prática e teórica entre os países mais desenvolvidos”. Em 1919 a Internacional Comunista, nascida de uma longa luta da esquerda internacionalista mundial para a transformação da guerra imperialista em guerra civil, seja na mais democrática das repúblicas seja no mais autocrático dos impérios ou na mais constitucional e parlamentar das monarquias, retomou e tornou próprios os estatutos da Primeira Internacional. Proclamou que “a nova Internacional dos Trabalhadores é constituída pela organização de ações comuns de proletários de diferentes países que visam o único fim da destruição do capitalismo, a instauração da ditadura do proletariado e de uma república internacional dos Sovietes para a completa eliminação das classes e para a realização do socialismo, este último, primeiro estágio da sociedade comunista”, acrescentando que “a estrutura organizativa da Internacional Comunista deve garantir aos operários de cada país a possibilidade de receber a cada momento a maior ajuda possível por parte dos proletários organizados dos outros países”.
O fio desta grande tradição foi quebrado no intervalo entre as guerras pela teoria e práxis do “socialismo num só país” e pela substituição da luta por uma ditadura proletária pela luta da democracia contra o fascismo. A primeira primeira posição desenlaçou o destino da revolução vitoriosa na Rússia do restante do movimento revolucionário proletário em todo o mundo, condicionando os desenvolvimentos deste último aos mutáveis interesses diplomáticos do Estado soviético. A segunda, dividiu o mundo em países fascistas e democráticos, ordenando aos proletários enquadrados nos regimes totalitários de lutar contra o seu governo não pela conquista revolucionária do poder, mas pela restauração das instituições democráticas e parlamentares, e aos proletários enquadrados nos regimes democráticos de defender os próprios governos e, se necessário, ir à guerra contra os próprios irmãos do outro lado da fronteira, assim, tais posições ligaram o destino da classe operária ao destino das respectivas “pátrias” e das suas instituições burguesas.
A dissolução da Internacional Comunista durante a segunda guerra mundial foi o resultado lógico desta reviravolta de doutrina, de estratégia e de táctica. Do novo massacre imperialista apareceram na Europa oriental alguns Estados que se diziam socialistas, mas que proclamavam e defendiam furiosamente a própria “soberania” nacional; que se diziam irmãos, mas estavam isolados por fronteiras zelosamente defendidas; que se diziam membros de um “campo socialista”, mas estavam divididos por contrastes e tensões econômicas, e para os resolver, principalmente quando chegavam a um ponto crítico, não sobrava senão a força bruta (Hungria, Checoslováquia) ou que, quando a intervenção militar não era possível, davam lugar a rachas profundos como no caso da China e da Iugoslávia. Por sua vez, os partidos que ainda não tinham chegado ao “poder” reivindicavam a existência de uma própria “via nacional ao socialismo” (que era para todos uma única via de renúncia da revolução e da ditadura proletária e a completa adesão à ideologia democrática, parlamentar e reformista) e se apresentavam, com uma orgulhosa defesa da própria autonomia em relação aos outros partidos “irmãos”, como os herdeiros das mais puras tradições políticas e patrióticas das respectivas burguesias, prontos a apanhar – como na expressão de Stalin – a bandeira que as respectivas burguesias tinham deixado cair das mãos.
Já naquele tempo o Internacionalismo tinha sido reduzido a uma frase ainda mais vazia e retórica do que palavra de “fraternização internacional dos povos”; um slogan que Marx na Crítica ao programa de Gotha violentamente respondeu ao Partido Operário alemão como sendo um “pedido emprestado pela Liga Burguesa pela Liberdade e Paz”. Há tempos nenhum exemplo de solidariedade internacional efetivo se materializou, nem sequer em momentos de grande tensão social (greves de mineiros na Bélgica, dos trabalhadores portuários na Inglaterra, revoltas de proletários negros na indústria automobilística americana, greve geral francesa em 1968, etc.) – e nem seria possível enquanto se proclamava que cada proletariado e partido “comunista” tinham de resolver, e eram os únicos “competentes” em resolver, os seus problemas particulares, cada um no seu próprio cantinho “privado”, como defensor das instituições e tradições da pátria, da economia nacional, e até das sagrados “fronteiras”. Qual o valor de um internacionalismo não de palavras mas “de fato” (Lenin), se a mensagem dos “novos partidos” ao mundo era o da coexistência pacífica e da disputa simulada entre capitalismo e “socialismo”?
Um movimento proletário revivido, com todas as suas características históricas intactas, só surgira na condição que se reconheça que em todos os países há apenas uma rota para a emancipação, que apenas apenas um partido pode existir, a doutrina, princípios e normas práticas de ação deste devem ser do mesmo modo integradas e únicas. O partido, invés de ser mistura híbrida de programas desordenados, de idéias conflitantes e confusas, representa uma “superação segura e orgânica de todos os impulsos particulares suscitados pelo interesse de grupos proletários, divididos por categorias profissionais e pelo pertencimento nacional, em uma força sintética ativa no sentido da revolução mundial” (Plataforma política do Partido, 1945).
* * *
A abdicação do movimento comunista de suas tarefas revolucionárias internacionais espelhou-se cruelmente no vergonhoso abandono completo da clássica posição do marxismo frente às lutas insurrecionais dos povos coloniais contra a opressão imperialista, lutas que no segundo pós-guerra tinham assumido aspectos de extrema violência no mesmo ato em que o proletariado das metrópoles imperialistas estava covardemente emparelhado à carroça da “reconstrução” burguesa. Frente às lutas armadas dos povos coloniais que já no primeiro pós-guerra chacoalhavam o imperialismo, em 1920 o segundo congresso da Internacional Comunista e o primeiro congresso dos Povos de Oriente delineavam a grandiosa perspectiva de uma estratégia mundial única que unisse o derrotismo da insurreição social nas metrópoles capitalistas à revolta nacional nas colônias e semi-colônias. Esta revolta, politicamente dirigida pelas jovens burguesias coloniais, perseguia o objetivo burguês da unidade e da independência nacional, mas que, numa conjuntura política que “põe como ordem do dia em todo o mundo a ditadura do proletariado” (Lenin): de um lado, a intervenção ativa na luta dos jovens partidos comunistas de forma política e organizativamente independentes liderando as gigantescas massas operárias e camponesas e pelo outro, a ofensiva do proletariado metropolitano contra as cidadelas do colonialismo, esta conjunção de forças políticas tornaria possível a superação dos partidos nacional-revolucionários e a transformação de revoluções originariamente burguesas em revoluções proletárias, segundo o esquema da revolução para sempre traçado por Marx e confirmado pelos bolcheviques na semi-feudal Rússia de 1917.
O eixo desta estratégia era e não podia deixar de ser o proletariado revolucionário dos países “mais civilizados”, isto é, economicamente mais avançados, porque a sua vitória e somente ela teria fornecido aos países economicamente retrógrados do mundo colonial a possibilidade de superar a desvantagem histórica do seu subdesenvolvimento: ao tomar o poder e se tornarem mestres dos meios de produção, o proletariado metropolitano teria incorporado as economia das ex-colônias mediante um “plano econômico mundial”, que, enquanto unitário como tende a ser o do capitalismo, não teria desejado nenhuma opressão ou conquista, nenhum extermínio ou exploração; e os povos coloniais, graças à “subordinação dos interesses imediatos dos países revolucionariamente vitoriosos aos interesses gerais da revolução em todo o mundo”, teriam chegado ao socialismo sem ter de passar pelos horrores de uma fase capitalista ainda mais feroz para que pudesse se colocar juntamente das economias mais desenvolvidas.
No momento que em 1926-27 o destino da Revolução Chinesa começava a se revelar, nenhuma parte deste poderoso edifício marxista se manteve intacto do oportunismo. Nas colônias, os partidos supostamente comunistas, sobretudo depois da segunda guerra mundial, longe de “assumir a liderança das massas exploradas” e acelerar o ruptura com os blocos, constituídos sob a bandeira da independência nacional, puseram-se a reboque da burguesia nacional e até das classes e senhores feudais “anti-imperialistas” ou, quando tomado o poder, reivindicaram o programa político da democracia constitucional, parlamentar e pluripartidária “esquecendo-se” de “pôr em primeiro plano a questão da propriedade” e de proceder com pelo menos a confiscação sem indenização das imensas terras dos proprietários fundiários (vitalmente ligados à burguesia comercial e industrial e, através dela, ao próprio imperialismo), o jovem, mas extremamente concentrado e corajoso proletariado local nunca foi tratado como uma vanguarda das massas camponesas e semi-proletárias, que há séculos vivem na total miséria, e que ruíram juntos o jugo do capital. Nas metrópoles imperialistas, por outro lado, eles tinham renunciado os princípios da revolução violenta e da ditadura proletária e, caindo ainda mais baixo do que os reformistas da Segunda Internacional, limitaram-se na França, durante a última parte da guerra da independência argelina, como na América durante a guerra de Vietnam, a invocar a “paz” e “tratativas” e a pedir aos respectivos governos o “reconhecimento formal e puramente oficial da igualdade e da independência” das jovens nações, uma posição que a Terceira Internacional tinha banido e definido como a hipócrita palavra de ordem dos “burgueses democráticos que se camuflam de socialistas”.
A consequência desta completa perda da perspectiva marxista sobre as revoluções duplas é, e foi, que o potencial revolucionário presente nas gigantescas, e frequentemente sangrentas, rebeliões – a grande maioria partindo de milhões de proletários e camponeses pobres – teria sido perdida: nos países agora formalmente independentes, uma burguesia corrupta, gananciosa e parasítica esta no poder, consciente da ameaça por parte das massas exploradas no campo e na cidade, e assim mais do que prontas de forjar novas alianças com o “Inimigo” do passado, o imperialismo. Enquanto isso, o capital nos velhos centros capitalistas, após ter tido que recuar, simplesmente retorna à colonia pela porta dos fundos, por meio de “auxílios”, empréstimos, comércio de manufatura e materiais brutos, ele escapa sem nenhum arranhão. Ao mesmo tempo, o resultado da paralisia que afetou o proletariado e o movimento revolucionário comunista nas fortalezas do imperialismo foi se uma aparente legitimidade histórica das degeneradas teorias maoistas, castristas e guevaristas, que apresentavam as ilusórias revoluções camponesas, populares ou libertárias como a única saída do pântano mundial do reformismo legalista e pacifista. Tudo isto é resultado do abandono da via internacionalista.
Mas o internacionalismo – renegado por todos os partidos ligados à Moscou ou Pequim – esta destinado a ressurgir porque se vê comprovado nos fatos de uma economia e sistema de comércio cada vez mais globais, e na extinção das hipotecas nacionais – que sustentava nas colonias a frente unida de todas as classes, a sua industrialização forçada, a rápida transformação das suas estruturas políticas e sociais – assim, em todo o lugar, a Guerra de Classes e a Ditadura do Proletariado voltam à estar na ordem do dia. Isto serve para demonstrar o papel atual do Partido Comunista Internacional em auxiliar a jovem classe operária autóctone do chamado “Terceiro Mundo” a libertar definitivamente o seu próprio destino, se separando de uma vez por todas, daqueles que se encontram no poder, e assumir o seu lugar no exército mundial da revolução comunista.
Em termos programáticos, a nossa concepção do socialismo distingue-se de todas as outras ao postular a necessidade de uma revolução violenta, a destruição de todas as instituições do Estado burguês e a criação de um novo aparelho estatal dirigido, a ser colocado em sentido oposto por um único partido: o qual terá preparado, unificado e conduzido à vitória os ataques proletários ao velho regime.
Mas, como rejeitamos a concepção de uma gradual e pacífica passagem do capitalismo ao socialismo sem uma revolução política, isto é, sem a destruição da democracia, assim também rejeitamos a concepção anarquista que limita as tarefas da revolução à mera destruição do poder do Estado existente. A revolução política abre para o marxismo ortodoxo uma nova época social que é interessante definir em grandes fases:
Politicamente, ela é caracterizada pela ditadura do proletariado; economicamente, por uma sobrevivência das formas especificamente ligadas ao capitalismo: uma distribuição mercantil dos produtos, mesmo que distribuídos pela grande indústria, e, em certos sectores, sobretudo agrícolas, uma produção de tipo parcelar. Estas formas não podem ser superadas senão segundo medidas despóticas do poder proletário: uma passagem sob a sua gestão de todos os sectores de caráter colectivo (grande indústria, grande agricultura, grande comércio, transportes, etc.); pôr em movimento um vasto aparelho de distribuição independente do comércio privado, mas sempre operando, pelo menos num primeiro momento, segundo critérios mercantis. Nesta fase, todavia, a tarefa da luta militar prevalece sobre a da reorganização econômica e social, a não ser que, contra toda e qualquer a previsão racional, a classe derrotada, abatida internamente e ameaçada no exterior renuncie da resistência armada.
A duração desta fase depende, por um lado, da escala das dificuldades que a classe capitalista conseguirá criar para o proletariado revolucionário, por outro, da extensão do trabalho de reorganização necessário, que é inversamente proporcional ao estado alcançado pela economia e pela sociedade em cada setor e país e por isso, será mais fácil nos países desenvolvidos.
Esta fase deriva dialeticamente da primeira. As suas características são as seguintes: o Estado proletário dispõe de todo o produto de troca, mesmo subsistindo ainda um sector de pequena produção; é esta a condição para passar a uma distribuição que já não é monetária, mas que conserva ainda um carácter de troca, pois a atribuição dos produtos aos produtores depende da sua prestação de trabalho e se efetua mediante o seu atestado por meio de vales de trabalho. Tal sistema diferencia-se essencialmente do assalariado que une os ganhos do trabalhador ao valor da sua força de trabalho, escavando uma fossa sempre crescente entre a vida dos indivíduos e as possibilidades e as riquezas sociais. Sob o Socialismo, nenhum obstaculo existe entre as necessidades e as suas satisfações, salvo a obrigação do trabalho para todos os indivíduos válidos, cada progresso da sociedade, que sob o regime capitalista se erguia de maneira hostil contra a classe produtora em relação ao proletariado, torna-se imediatamente um meio de emancipação para toda a espécie. De toda forma, ainda teremos de lidar com formas herdadas diretamente da sociedade burguesa: “A mesma quantidade de trabalho que o produtor deu à sociedade sob uma forma, recebe-a em outra forma… Domina aqui o mesmo princípio que regula a troca das mercadorias enquanto ele é troca de coisas de igual valor… O direito igual é aqui ainda e sempre, segundo o princípio, o direito burguês; se bem que princípio e prática não mais se combaterão, enquanto que a troca de mercadorias equivalentes, existe somente em média, não para o caso individual. Apesar do progresso, este direito igual traz ainda e sempre um limite burguês… o direito dos produtores é proporcional às suas prestações de trabalho” (Marx, Crítica do Programa de Gotha). O trabalho, sobretudo, continua a aparecer como uma constrição social, todavia, é sempre menos opressivo, na medida em que as condições gerais do trabalho melhoram.
Por outro lado, o fato que o Estado proletário dispõe dos principais meios de produção permite (depois da supressão draconiana de todos os setores econômicos inúteis ou anti-sociais, que começa já na fase transitória) um desenvolvimento acelerado dos setores sacrificados pelo capitalismo, que são sobretudo a casa e a agricultura: permite ainda uma reorganização geográfica do aparelho produtivo, que leva à supressão do antagonismo entre cidade e campo e à constituição de uma só unidade de produção em escala continental. Esta permite igualmente a integração dos pequenos produtores na produção social, graças às vantagens que o Estado proletário lhes consentirá, desde que aceitem a passagem a uma forma mais evoluída e concentrada de produção.
Por último, todos os progressos realizados deste modo constituem a abolição das condições gerais que, de um lado, fixam o sexo feminino a um trabalho doméstico improdutivo e mesquinho, e do outro, confinam toda uma fração de produtores a atividades puramente manuais, fazendo do trabalho intelectual um privilégio social e entregando todo o patrimônio dos conhecimentos científicos a uma só classe da sociedade. Assim se desenha, para além da abolição das classes nas relações respectivas com meios de produção, o desaparecimento da atribuição fixa de determinadas tarefas sociais a determinados grupos humanos.
Na medida em que se cumpre estas tarefas, para as quais se nasceu e que transcendem a sua função histórica de prevenção e repressão das tentativas de restauração capitalista, o Estado tende a desaparecer enquanto Estado, isto é, enquanto domínio sobre os homens, para tornar-se um simples aparelho de administração das coisas. Este definhamento está ligado ao desaparecimento de classes distintas e opostas no seio da sociedade, e, consequentemente, realiza-se com a transformação do camponês (ou artesão) num produtor industrial. Assim se chega ao estado do comunismo superior, caracterizado por Marx deste modo: “ Numa fase superior da sociedade comunista, depois de ter desaparecido a servil subordinação dos indivíduos à divisão do trabalho e, com ela, também a oposição entre trabalho espiritual e corporal; depois de o trabalho se ter tornado, não só meio de vida, mas, ele próprio, a primeira necessidade vital; depois de, com o desenvolvimento omnilateral dos indivíduos, as suas forças produtivas terem também crescido e todas as fontes manantes da riqueza co-operativa jorrarem com abundância – só então o horizonte estreito do direito burguês poderá ser totalmente ultrapassado e a sociedade poderá inscrever na sua bandeira: De cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo as suas necessidades!”.
Este grande resultado histórico envolve não só a destruição do antagonismo entre o homem – a causa de sua inquietude e de sua insegurança “geral, particular e perpetua” (Babeuf), o destino de toda a humanidade sob o capitalismo – como é também a condição fundamental para o domínio real da Sociedade sobre a Natureza o qual Engels descreveu como “a passagem do reino da necessidade para o reino da liberdade”, o desenvolvimento da humanidade e de suas potências seram pela primeira vez um fim em si mesmo. É então também, que a práxis social ela mesmo providenciará para todas as antinomias do pensamento tradicional “entre existência e essência, objetificação e auto-afirmação, liberdade e necessidade, indivíduo e espécie” (Marx), o comunismo então finalmente sera merecedor da descrição aplicada a ele pelos fundadores do Socialismo cientifico como um “enigma finalmente resolvido pela História”.
A reconstrução à escala nacional e internacional de um partido político proletário capaz de garantir a continuidade da política revolucionária não poderá tornar-se um fato histórico efetivo se as forças de vanguarda do proletariado dos países avançados e subdesenvolvidos não se orientarem em torno às posições cardinais supradefinidas. O comunismo ortodoxo distingue-se de todas as variedades de extremismos mais ou menos socialistas, porque nega que a evolução da sociedade moderna previne que o proletariado se organize em um partido revolucionário. Ele mantém que nesta fase substancialmente fascista do domínio capitalista, as leis que determinaram o esgotamento das lutas políticas entre partidos burgueses, não é aplicável ao proletariado. Este afirma, pelo contrário, que é o próprio eclipsar-se das oposições, mesmo formais, entre direita e esquerda clássicas, entre liberalismo e autoritarismo, entre fascismo e democracia, que fornece a melhor base histórica para o desenvolvimento de um partido decisivamente comunista e revolucionário. A realização desta possibilidade está ligada não só à explosão inevitável de uma crise aberta a um prazo mais ou menos breve, mas ao agravar-se objetivo dos contrastes sociais mesmo em fases de expansão e prosperidade. Quem quer que exprima a mínima dúvida sobre este ponto duvida também das perspectivas históricas da revolução comunista. Tal atitude pode ser explicada pela repercussão do recuo causado pela degeneração da terceira internacional, pela Segunda Guerra Mundial, pela expansão e consequente fortalecimento do capitalismo. Isto no entanto, é apenas um reflexo do temporário triunfo do capital nas mentes de seus “coveiros” e longe de garantir vida eterna a este regime, este triunfo prepara, por ter antes barrado, a explosão revolucionária mais violenta da História.
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O desenvolvimento do partido não pode obedecer a regras formais do tipo daquelas que as oposições anti-stalinistas reivindicaram sob o nome de “centralismo democrático”. Isto por que tais regras consistem em entender que a sua orientação correta depende da livre expressão do pensamento e da vontade de uma “ base” proletária e do respeito pelas regras democráticas e dos cânones eleitorais na designação de responsáveis para os diferentes níveis e papeis. Enquanto não negamos que o sufocamento das oposições e as irregularidades em procedimentos tenham efetivamente servido na liquidação da tradição revolucionária comunista na Rússia e no mundo, o nosso partido define e sempre definiu esta liquidação, essencialmente, como a liquidação de um programa e de uma táctica o qual o eventual regresso a normas organizativas consistentes, como esperado pelos trotskistas, não seria capaz de impedir. Da mesma maneira, mais do que um estatuto que comporte um amplo e constante uso do mecanismo majoritário, nós depositamos nossas esperanças em uma definição sem equívocos e sem concessões de fins e de meios da luta revolucionária.
O partido deve formar seus próprios órgãos e selecionar em seu próprio seio aqueles evidentemente aptos a aplicar sem hesitações o seu “catequismo”, caso não consiga realizar tal tarefa, é de se por em cheque a sua própria existência enquanto partido. Em tal caso, a importância esta nesta seleção e não em um modelo qualquer de funcionamento interno. Tal é o conteúdo da fórmula do centralismo orgânico, que antes a nossa corrente e hoje o partido tem contraposto e contrapõe à do centralismo democrático. Mantemos o foco sobre o único elemento verdadeiramente essencial, que é o respeito não da maioria, mas do programa; não da opinião individual, mas da tradição histórica e teórica do movimento. A esta concessão corresponde uma estrutura interna, a qual os apoiadores inveterados das liberdades individuais ou coletivas ira estigmatizar como uma ditadura de comitês e até de indivíduos, mas que, realiza de forma substancial a condição sine qua non da persistência do partido como organismo revolucionário: a ditadura de princípios. Realizada esta condição, a disciplina da base às decisões do centro obtém-se com o mínimo de atritos, enquanto que uma verdadeira ditadura de indivíduos apenas se torna uma necessidade no momento em que a tática do partido se separa da autoridade do programa, suscitando tensões e embates, que podem ser solucionados apenas por meio de medidas disciplinares; precisamente como aconteceu na Internacional, mesmo antes da vitória de Stalin.
O desenvolvimento histórico do partido de classe manifesta, qualquer que seja a época, “o afastamento de uma vanguarda do proletariado do terreno dos movimentos espontâneos suscitadas por interesses parciais e de grupo, a um terreno de ação proletária geral”. Este resultado é favorecido não só por uma negação destes movimentos elementares, mas, pelo contrário, por uma participação do organismo, mesmo que embrional, do partido nas lutas físicas do proletariado. O trabalho de propaganda ideológica e de proselitismo, que se segue naturalmente à fase embrionária de clarificação ideológica, não pode separar-se da intervenção nos movimentos econômicos. Ao mesmo tempo, nunca atribuindo o valor de um fim em si às “conquistas” sindicais, obedecendo uma dupla preocupação: fazer destes movimentos um meio para adquirir a experiência e o treino indispensáveis a uma real preparação revolucionária mediante uma crítica impiedosa das previsões, dos postulados e dos métodos dos sindicatos e dos partidos conciliadores que os controlam; e, num estagio mais avançado, realizar a sua unificação e a sua superação revolucionária na experiência vivente, empurrando-os à sua realização plena e completa.
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Nas últimas décadas os sindicatos oficiais tem sido cada vez mais imunes à tentativas de unificar e generalizar as lutas e resistente aos pedidos de suas bases. Como consequência, a mais eficientes e melhores lutas tem sido aquelas realizadas por fora do controle das grandes federações de sindicatos. As organizações que nascem desses movimentos possuem uma riqueza de experiência extremamente valiosa para o proletariado e devem ser defendidas pelo partido a qualquer custo. Enquanto a possibilidade de um realinhamento das políticas dos sindicato oficiais com o campo classista (em momentos de revolta generalizada e de grandes movimentos econômicos) não pode ser eliminada, essas organizações no presente agem mais como órgãos do Estado Burgues em meio a classe trabalhadora do que como órgãos proletários de luta econômica.
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Hoje todos os problemas relativos ao desenvolvimento do partido põe-se ao meio de uma crise ideológica e prática sem precedentes no movimento internacional socialista. Isto é certamente verdade, mas a experiência passada basta para estabelecer uma lei: a reconstituição da potência ofensiva da classe operária não pode ser o resultado de uma revisão, de uma atualização do marxismo e da “criação” de uma suposta doutrina nova, mas pode ser somente o fruto daquela restauração do programa originário que, frente aos desvios da Segunda Internacional, tinha sido garantida pelo partido bolchevique e que, frente aos da Terceira, tinha sido garantida pela Esquerda marxista italiana em condições gerais ainda piores. Quaisquer que sejam os setores em que a luta pelo comunismo está destinada a renascer, qualquer que seja o tempo que nos separa dele, o movimento internacional futuro não pode senão ser o ponto de chegada histórico da luta suportada por esta corrente, e é provável que mesmo fisicamente essa corrente tenha de sustentar um papel decisivo. Por isso, na fase atual a reconstituição de um embrião da Internacional pode tomar uma só forma: a adesão ao programa e à ação do Partido Comunista Internacional e a criação de elos organizativos com ele de modo a que respondam ao princípio do centralismo orgânico e sejam isentos de qualquer forma de democratismo.
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O comunismo é uma exigência mundial e absoluta da sociedade de hoje. Mais cedo ou mais tarde, as massas proletárias regressarão ao ataque das fortalezas do capitalismo numa grande onda revolucionária. A destruição destas fortalezas, a vitória do proletariado, pode verificar-se apenas se a tendência à reconstituição do partido de classe se aprofundar e se estender a todo o mundo. A constituição do partido mundial do proletariado; eis o fim de todos os que querem a vitória da revolução comunista, contra a qual lutam as forças unidas da Internacional burguesa.